No Cemitério de Maruí, em Niterói, existe um monumento às vítimas do episódio conhecido como Combate da Armação e que ajudou a pôr fim, há 130 anos, à Revolta da Armação. A ação, considerada pelos historiadores como uma "carnificina", foi provocada pelo então presidente Floriano Peixoto que, descumprindo a Constituição em vigor na época, recusou-se a promover novas eleições para a Presidência. No combate contra a Armação, na Ponta da Areia, dezenas de pessoas foram mortas.
Tudo começou quando, na recém-implantada República, Floriano Peixoto, na condição de vice-presidente eleito, teve que assumir o cargo vago com a renúncia do Marechal Deodoro da Fonseca. Descumprindo a Constituição, ele recusou-se a promover novas eleições, decidido que estava a cumprir o mandato até o fim do período presidencial (15/11/1894), podendo até reeleger-se para o período seguinte.
Essa situação gerou muitos protestos e descontentamentos da sociedade. A Marinha, ou Armada, como era denominada no império, rebelou-se e um amplo movimento insubordinado eclodiu em vários pontos do País. Como o Rio de Janeiro, Niterói foi bastante castigada. A rebelião, na verdade, teve início em 06 de setembro de 1893, quando a população de Niterói e do Rio de Janeiro acordou com o troar dos canhões.
O então ministro da Marinha, vice-almirante baiano Custódio José de Melo que havia pedido demissão em abril do mesmo ano, a bordo da corveta Aquidabã, enviava manifestos ao povo, nos quais afirmava ser a deposição de Floriano Peixoto o caminho da salvação da Pátria. Na manhã deste dia, sob a proteção do navio monitor Javari, desembarcou uma tropa na Ponta da Areia, apoderando-se de toda a munição do Centro de Armanento. O serviço de barcas para o Rio de Janeiro, irregular no primeiro dia, depois que a barca Segunda foi afundada por um petardo, ficou interrompido até março do ano seguinte. Também deixou de funcionar o serviço telefônico, inaugurado dias antes da Revolta, por danos causados no cabo submarino entre as duas cidades.
Ataques provocaram pânico na cidade
Em seu livro "Niterói Cidade Sorriso", o médico o escritor Carlos Wehrs também narra o episódio com detalhes. Segundo ele, houve mais de uma tentativa contra a Armação e a tomada pelos revolucionários de outros centros militares, como a ilha de Mocanguê, onde existia um depósito de 5 mil toneladas de carvão-de-pedra de uma empresa nacional e da companhia
Messageries Maritimes. A Fortaleza de Santa Cruz e o Forte de Gragoatá também foram castigados pelos revolucionários.
A resistência de Niterói foi comandada pelo coronel Fonseca Ramos, comandante da Força Policial, que com um efetivo de menos de 80 homens e o reforço do Corpo de Bombeiros de Niterói ainda conseguia contornar a situação. No dia 9 de setembro a cidade sofreu o primeiro bombardeio, vindo da canhoneira Marajó, na enseada de São Lourenço, atingindo o quartel da Força Policial e prédios próximos. De outros pontos, também abriram fogo contra a cidade os navios Aquidabã, República e Trajano. Os ataques levaram pânico à população, que deixou suas casas à procura de abrigos. No dia seguinte, Niterói recebeu reforço humano e munição do governo federal. Neste mesmo dia foi decretado estado de sítio nas duas capitais (Niterói e Rio de Janeiro).
Aos poucos, o Centro de Niterói, onde já não havia mais comércio aberto em virtude da falta de abastecimento - a população procurou abrigo nos bairros mais afastados da orla marítima - e foi sendo ocupado por homens da Força Policial do Estado, dos Bombeiros de Niterói, dos batalhões de Infantaria e Artilharia, entre outras unidades. Também foram guarnecidos com artilharia o Forte de Gragoatá e a Armação, assim como outros pontos estratégicos de Niterói e São Gonçalo.
O morro do Hospital São João Baptista (hoje do Valonguinho), também foi guarnecido e, temendo mal maior, os doentes transferidos paras as salas de aula do Colégio Salesiano de Santa Rosa. As saídas das ruas perpendiculares à praia foram obstruídas por sacos de areia e os transportes coletivos cessaram suas atividades. Paralisaram, também, os serviços de limpeza pública e domiciliar e a remoção das matérias fecais (ainda não havia serviço de esgoto). Durante meses Niterói foi duramente bombardeada, acarretando mortes e estragos.
Na madrugada do dia 9 de fevereiro de 1894, sob o comando do almirante Saldanha da Gama, os revoltosos - 520 homens divididos em cinco colunas - desembarcaram na Armação, na Ponta da Areia, apoiados por navios e lanchas estrategicamente colocados nas ilhas próximas. As baterias da Armação, que tanto molestavam os navios, foram tomadas de assalto, à arma branca, tendo sido os niteroienses trucidados a golpes de machado e baioneta. Enquanto alguns conseguiam fugir da carnificina, outros eram degolados.
A reação, porém, não se fez esperar: cerca de três mil soldados, seguindo ordens do coronel Fonseca Ramos, contra-atacaram e conseguiram inutilizar os canhões do Aquidabã, retomar os barcos pequenos e voltar para os navios e ilhas próximas. Ao meio-dia, com a baixa de 150 homens, Niterói já era senhora da situação. Entre os feridos que não resistiram, estava o coronel Francisco Gomes Machado. Do lado dos revoltosos, 250 homens morreram.
Niterói, que era a capital do estado do Rio de Janeiro, teve seus sete fortes bombardeados. Em 20 de fevereiro de 1894, a sede do governo foi então transferida para Petrópolis, cidade serrana fora do alcance dos canhões da Marinha. Niterói só voltaria a sediar a capital em 1903.
A vitória dos florianistas foi, finalmente, celebrada em 13 de março, quando a guarnição de Niterói conseguiu desalojar os revoltosos das ilhas do interior da baía e substituir as bandeiras amarelas (utilizadas pelos insubordinados) pelo pavilhão nacional.
Imagem de capa: Aspecto da Baía de Guanabara no dia 13 de setembro durante o bombardeio entre as Fortalezas e os navios revoltosos (Revista Ilustrada, out/1893).
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