A terceira edição de 2004 dos Projetos Especiais do Museu de Arte Contemporânea de Niterói, que ocorre de 14 de agosto a 26 de setembro de 2004, apresenta os trabalhos de Felipe Barbosa e Rosana Ricalde, dois artistas representantes da produção brasileira emergente destes primeiros anos do século XXI. As obras exibidas na mostra Palavra - Matéria Escultórica travam entre si um diálogo cujo fiel parte de um dado aparentemente simples, mas de profundas consequências na reconfiguração executada pela espacialidade moderna e contemporânea: a palavra como dispositivo plástico.

O ingresso da palavra na visualidade, pelo menos desde a ordem renascentista, seria demarcado pela sua presença traumática no espaço plástico, uma vez que ela reconduz a obra a sua existência ambiguamente transitiva entre uma efetividade material e uma contemplação distanciada. Coloca-se no cerne de transformações instauradas no modo operativo e na definição das artes visuais, ilustrada por episódios como o cubismo, a poesia visual, a arte conceitual, entre outros. Nos trabalhos de Rosana e Felipe a palavra ativa uma tensão simultaneamente relativa a "realização" do espaço e ao seu paradoxal caráter especulativo/evidente.

Há o jogo de atritos entre dois sistemas cognitivos históricos, duas ordens assumidas como paradigmáticas e antagônicas: a ótico-visual, entendida como experiência essencialmente sensível e, portanto, não coercível a um conhecimento lógico (e logocêntrico) e a textual, remetida a uma natureza decididamente intelectiva. Esta polaridade é desfeita em suas obras, suas fronteiras mesclam-se, confundem-se. A palavra retoma um sentido especulativo, na medida em que, translúcida, convoca o olhar a atravessa-la, a procurar em seus vazios algo evocado em seu conteúdo inicial.

Simultaneamente, ela retém uma objetividade quase escultórica. Ela se implanta como um dispositivo construtivo, estabelece um princípio comum que elabora séries associativas desvinculadas de uma lógica formal prévia, ou talvez ao contrário, de sua denominação a posteriori e circunstancial, ou de uma organização materializada por uma incisiva negatividade.

Seja por um viés ou outro, o que ambos nos fazem observar é uma irônica problematização da encruzilhada demarcada pela arte conceitual. Pois, se aquela colocava o limite da arte na reflexão de sua definição, aqui os dois artistas convocam tal indagação como ponto de partida de novas investigações possíveis, para as quais, todavia, a escrita (ou reescrita) desta - ou destas - pergunta(s) só se torna viável quando propostas materialmente a enfrentar sua inscrição no mundo.


Serviço

"Projetos Especiais III - Felipe Barbosa e Rosana Ricalde
Curadoria: Guilherme Bueno
Abertura: 14 de agosto de 2004
Visitação: 14 de agosto a 26 de setembro de 2004

Local: Varanda
Museu de Arte Contemporânea (MAC)
Mirante da Boa Viagem, s/n – Niterói RJ
Informações: 21 2620 2400 / 2620 2481


Tags:






Publicado em 04/09/2023

Artista portuguesa Bela Silva celebra a natureza no MAC Niterói De 06 de abril a 12 de maio
MAC apresenta 'Cinco convites a um levante', de Alex Frechette De 02 de março a 12 de maio de 2024
MAC Niterói apresenta exposição coletiva "Outras paisagens" De 06 de abril a 26 de maio de 2024
Cinco Invitaciones a un Levantamiento - Alex Frechette
Five Invitations to an Uprising - Alex Frechette
Cinco convites a um levante - Alex Frechette
MAC Niterói abre exposição em homenagem às trabalhadoras do mar De 09 de março a 16 de junho
MAC como Obra de Arte ENCERRADA
A Dinâmica de uma Coleção", por Claudia Saldanha