Foi cm oito anos de idade, ao tomar contato com o espetáculo "O Lago dos Cisnes" - em um filme -, que Helfany Peçanha se apaixonou pelo balé. Logo então, passou a andar em ponta e usar 'tutu', ensaiando seus primeiros passos na arte.
Quem imaginava que a pequena dançarina se tornaria uma das principais bailarinas e coreógrafas de Niterói? Pioneira e ousada artista da dança, Helfany despontou logo cedo, levando o balé clássico para as ruas, praças, praias e comunidades, consolidando-se como uma referência cultural em dança por mais de 60 anos.
Filha da pianista, violonista, bandolinista e pintora Helena Peçanha, Helfany nasceu em 12 de dezembro de 1936 e iniciou os estudos em dança nas duas academias existentes na cidade: a de Yvone Maia Forte, fundada em 1938, e a de Eunice Linton, em 1942. Percebendo a precocidade da menina, a professora Eunice, também uma grande referência para o balé e a cultura niteroiense, colocou Helfany em cena no espetáculo "Os Pássaros", no aclamado Casino Icharay, onde a pequena já se destacou.
"Era uma época em que o brasileiro se sentia menor e ninguém dançava os clássicos por aqui", contou Helfany, gargalhando ao lembrar que roubou as ceroulas do irmão e as pintou de preto para usar no palco na ocasião.
Aos 16 anos decidiu que iria se dedicar ao ensino de balé, na casa de seus pais, na rua Mariz e Barros, e não demorou muito para fundar sua própria escola, em 1952, a Ballet Helfany, a terceira da cidade e única daquela época em funcionamento até a década de 2020. Inicialmente no Clube Central e após um ano instalada próxima à Praia de Itapuca, Helfany sempre teve um carinho especial pelo trabalho como professora.
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"Antes disso, dava aula na casa de minha mãe, que controlava a vitrola... Ela trocava os discos enquanto eu comandava os
pas de deux...", revelou a veterana. Histórias não faltam, é claro. A artista sempre recordava com sorrisos da iniciação de seu primeiro aluno homem, Roberto Lima: "Ele começou fazendo jazz, mas quando percebi que arregalava os olhos para os clássicos, insisti que fosse à barra, e deu certo! Tornou-se um grande bailarino...".
A escola de Helfany acumula 30 prêmios no Festival de Joinville (SC), 10 no Conselho Brasileiro da Dança (CBDD), três na Argentina, três no Paraguai, dois no Peru, 20 no Festival Play House e 15 no Festival Tápias. Além disso, Helfany conta que foi a primeira coreógrafa a montar um balé de repertório clássico com alunos, em 1982. Um ano depois, ela tornou-se diretora artística da Companhia de Ballet da Cidade de Niterói.
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Em 2015, Helfany com a Diretora Geral do Teatro Municipal, Marilda Ormy. Clique para ampliar |
Sua carreira como professora lhe rendeu a Medalha Felisberto de Carvalho em seu Jubileu de Diamantes, que marcou os 60 anos de carreira da Maitre de Ballet e coreógrafa niteroiense, em 2012. A escola de Helfany revelou centenas de talentos e formou diversos profissionais, totalizando mais de cinco mil alunos, entre eles Marcela Gil, Míriam Camargo, Nícia Menezes, Rose Mansur e Simone Falcão, além de Roberto Lima, que em 1992 se tornou diretor da recém criada Cia de Ballet da Cidade de Niterói.
Casada com o oficial da Marinha Rogério Coelho, seu DNA artístico passou para dois de seus três filhos: Jânia Batista, que foi considerada uma das três mais importantes bailarinas do Brasil e fez parte do Ballet do Século XX e do Bejárt Ballet Lausanne, ambos na Bélgica. Hoje, na Suíça, Jânia dirige sua própria academia. Já Fernando Coelho, outro filho, é bailarino na Alemanha e assistente do diretor artístico do Balé de Salsbourg, na Áustria.
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A coreógrafa só deixou de dar aulas na cidade quando teve que acompanhar seu marido em temporadas no Pará e no Mato Grosso. A última viagem foi à Venezuela, em 1984, onde permaneceu por dois anos. Durante esse tempo, foi sua filha Jânia Baptista quem dirigiu a escola. Nesse momento, Helfany ministrou aulas em diversas companhias, como Ballet Nuevo Mundo de Caracas, Fundação Ballet Teresa Carreño e Cia. de Ballet, todas em Caracas, na Venezuela.
Helfany também se destacou como mediadora entre grupos, escolas e companhias de todo o tipo de dança, tendo sido responsável durante muitos anos pelo Encontro Fluminense de Dança, que reunia centenas de bailarinos em Niterói. A artista também dirigiu a Fundação Fluminense de Ballet, contribuindo para divulgar a dança, promovendo espetáculos, recitais e a integração cultural em toda a região.
A dama do balé clássico faleceu em 15 de junho de 2015, aos 78 anos, depois de mais de seis décadas como professora e coreógrafa. A mestra de uma geração de bailarinas deixou três filhos e dois netos.
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"Sabemos que será iluminada, pois aqui na Terra iluminou todos os cantinhos e caminhos por que passou. Beijos mãe e mestra, e o agradecimento eterno dos ensinamentos, de sempre amar e perdoar o próximo. Te amamos como você sempre nos amou. Siga em frente e quem sabe ainda nos encontraremos. Aqui um filho, de tantos que criou pelo mundo, de tantos que ensinou o caminho da bondade", declarou o filho Fernando Coelho.
Jorge Teixeira, diretor da Companhia Brasileira de Ballet, lamentou a morte de Helfany. "Fiquei muito triste com essa notícia. Apesar da Helfany nunca ter sido minha professora, ela sempre abriu as portas da casa e do estúdio dela para ajudar a me desenvolver como profissional e como pessoa. A honestidade e a solidariedade era algo muito forte dela, uma pessoa que lutava por todos que ela conhecia em qualquer ocasião. Ela recebida bailarinos de todo canto do Brasil e ajudava a hospedar, alimentar e treinar. Estava sempre pronta para receber e apoiar. A família toda lutou e luta muito em prol da dança no mundo".
"Eu a chamava de Fanny. Hoje, a dança está de luto, mas, em nossos corações, sabemos que ela estará feliz com Lele, seu amigo e companheiro. Nossas homenagens àquela que foi uma grande mestra e incentivadora de todos que amavam a dança. Descanse em paz Fanny, com a certeza de que cumpriu sua missão aqui na Terra", disse Nicia Menezes, proprietária da Nicia Menezes Dança & Cia, que dançou com a Helfany durante 18 anos.
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Helfany foi essencial para a popularização das escolas de balé e de profissionais da dança em Niterói, deixando sua marca na identidade cultural da cidade.
"Ela foi precursora e o nome mais marcante relacionado à dança. Muitos bailarinos e professores de dança passaram pelas mãos dela. E, para a Companhia de Ballet da Cidade de Niterói, ela foi muito especial, porque sempre esteve ao lado do grupo, até nos momentos mais difíceis, a ponto de emprestar o estúdio dela quando a Cia não tinha onde ensaiar. Viu todos os espetáculos e sempre foi incentivadora, sincera, crítica, uma espécie de conselheira que esteve ao nosso lado. Doou sua vida à dança e deixará saudades", declarou Pedro Pires, diretor da Companhia de Ballet de Niterói.
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