O MAC como laboratório e abrigo poético - Circuito de experiências participativas
Claudia Saldanha e Luiz Guilherme Vergara assinam a curadoria da exposição "Abrigo Poético - Diálogos com Lygia Clark", que o Museu Contemporâneo de Arte Modena - MAC Niterói, abriga de 02 de setembro a 03 de dezembro de 2006. A Curadoria Educativa fica por conta de Beatriz Jabor e equipe DAE.
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A arquitetura do MAC mais uma vez passa a fazer parte das nossas estratégias comunicativas através do exercício de olhar e ler o MAC em todos os "sentidos". Pela sua forma, conteúdo e função, assim como pela leitura de metáforas, percebendo o museu como um abrigo poético. Sua arquitetura
circular e aberta nos desafia a pensar sobre os limites entre arte e vida. Nada melhor, portanto, do que completar 10 anos de existência expondo a coleção que foi responsável pela sua origem e função, com uma homenagem à artista Lygia Clark, que acreditava firmemente na procura de uma fusão entre
arte e vida, da arte como experiência. O MAC tem como desafio ser abrigo e laboratório poético de experiências participativas para a contínua renovação da arte contemporânea brasileira.
A trajetória de Lygia Clark traz à tona uma série de questionamentos que parecem acompanhar a história da arte – o lugar do artista, a obra de arte e o papel do espectador. Sua obra acaba transformando os três, não só isoladamente como também nas relações entre eles. Assim como se modificam o papel do artista, a obra e o espectador, também é preciso se redefinir o papel do museu, que não pode mais ser apenas um lugar de contemplação de objetos. É preciso abrir espaço para a participação do espectador.
Para essa exposição criamos um circuito de experiências participativas esperando que, pela experiência, as obras de arte sejam percebidas não como objetos históricos e estáticos, mas como pensamentos que ativam processos dinâmicos de fluência criativa, como nos jogos. Com inspiração nas práticas e poéticas de artistas contemporâneos, em especial Lygia Clark, transformamos a varanda do MAC em um Laboratório entre Arte e Jogo, onde abrimos a obra de arte para que o seu processo de criação seja explorado como estratégia de ação e interpretação.
Dividimos o percurso da varanda do MAC em uma rede de referências entre obras (e artistas) de diferentes períodos históricos, apresentando os diálogos entre as obras expostas e conceitos presentes na obra de Lygia Clark. Nas paredes, reproduções das obras estavam interligadas formando uma constelação de referências, apontando para alguns caminhos na rede de relações e diálogos. A proposta era que o visitante pudesse perceber e fazer suas próprias "costuras" e elos entre as obras expostas.
Cada conjunto de obras apresentava determinados conceitos que depois poderiam ser experimentados na prática através de propostas interativas, em forma de jogos criados para este circuito participativo. O percurso foi elaborado com o objetivo de acompanhar as mudanças na trajetória artística e no pensamento de Lygia Clark, assim como de toda uma geração de artistas, passando pelas raízes da arte concreta e pelas rupturas neoconcretas até chegar às poéticas de artistas contemporâneos.
O primeiro conjunto de jogos interpretativos foi o dos Jogos Concretos e Neoconcretos, inspirados nos procedimentos artísticos dessa geração dos anos 1950 e 60, considerada a vanguarda brasileira da linguagem geométrica. Obras de Lygia Clark, Aluísio Carvão e Hermelindo Fiaminghi, pertencentes à Coleção João Sattamini, se transformaram em jogos de fluência criativa, em que as formas geométricas soltas da tela ganharam autonomia na mão do espectador; através do jogo, ele pôde compor infinitas possibilidades de construção de uma "mesma" obra, assim como fizeram os artistas dessa geração. As obras deste primeiro segmento estavam interligadas pelos seguintes conceitos: do plano ao módulo, a linha-espaço/a linha orgânica, o espaço real/o espaço virtual e do módulo ao jogo.
O segundo segmento apresentava as obras de Amilcar de Castro, Franz Weissmann, Hélio Oiticica, Iole de Freitas, Luciano Figueiredo e Paulo Roberto Leal, que assim como Lygia Clark saíram do plano e conquistaram o espaço pela dobra, seja pela sobreposição de planos formando relevos, pelas dobras e cortes que abrem o espaço no plano ou através de dobras orgânicas em espirais que dão a sensação de contínuo movimento. A arquitetura do MAC é uma das referências, pois também se desdobra em espirais em movimento – o concreto duro e pesado vira forma orgânica pelas curvas criadas por Niemeyer. Neste espaço o visitante era convidado a experimentar essa passagem do plano para o espaço escolhendo cuidadosamente onde e como dobrar e cortar uma folha de papel para criar sua forma no espaço.
Para finalizar o circuito de experiências participativas apresentamos dois conceitos agrupando diferentes artistas: Dos materiais às metáforas e Construa você mesmo – redes e costuras. O primeiro apresentava como Lygia Clark e os outros artistas reunidos nessa rede de relações vão em busca de materiais como metáforas aos conceitos que querem transmitir ao espectador, seja pela memória, pelas sensações ou associações que esses materiais provocam. As obras de Nazareth Pacheco, Eliane Duarte, Ernesto Neto, Artur Barrio, Cristina Salgado e Tunga inspiraram a reunião de diversos materiais em um "coisário" para que os visitantes pudessem criar objetos reunindo materiais a partir do sorteio ao acaso de palavras, podendo compreender essa relação entre a escolha dos materiais e o artista como construtor de metáforas.
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"Construa você mesmo - redes e costuras" girava em torno dos artistas João Modé, Jarbas Lopes, Eliane Duarte e Marcos Cardoso, "herdeiros" da geração de artistas como Lygia Clark que a partir dos anos 60 abrem a obra para a experimentação, a participação do espectador, e para experiências
coletivas em que o processo é parte fundamental e constituinte da obra. Com inspiração na trajetória de Lygia Clark, criou-se um percurso de construção da linguagem - do pensamento concreto de composição com formas geométricas -, passando pela conquista do espaço - o nascimento e criação da forma/organismo -, até chegar ao lugar onde se dá sentido, ao estado de nominação das coisas pela construção de metáforas, que é o estágio da criação e interpretação. Cada visitante que percorreu a varanda deixava para o próximo um presente, uma poesia visual, formando um contínuo processo de fluência criativa de artistas anônimos, verdadeiro laboratório e abrigo poético entre arte e jogo.
SERVIÇO
Exposição "Abrigo Poético - Diálogos com Lygia Clark"
Curadoria: Claudia Saldanha e Luiz Guilherme Vergara
Período: 02 de setembro a 03 de dezembro de 2006
Museu de Arte Contemporânea - MAC
Endereço: Mirante da Boa Viagem, s/n – Niterói RJ
Informações: 21 2620 2400 / 2620 2481
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