4 de agosto de 1996

Operários dão retoques finais no prédio, que receberá a coleção de arte de João Sattamini, a segunda mais importante do país

Depois de seis anos em obras, muitos alarmes falsos, obstáculos financeiros e prazos estourados, os niteroienses vão poder, enfim, conhecer o Museu de Arte Contemporânea (MAC), que deve ser inaugurado no final do mês. "Só falta marcar a data e fazer os convites para a festa", comemora Maria Auxiliadora Silveira, diretora do Museu Antônio Parreiras, que está prestando consultoria na estruturação e finalização do MAC.

Os 4 mil metros de carpete azul já estão praticamente instalados e a rampa de acesso ao museu, com 200 metros de extensão, está sendo pintada de vermelho rubi. Em seis anos de trabalho, as obras no Mirante da Boa Viagem consumiram cerca de US$ 5 milhões. Segundo o prefeito João Sampaio, a obra atrasou porque foram utilizados somente recursos do orçamento municipal.

Acervo Maria Auxiliadora da Silveira também cuidou da catalogação das mais de mil peças do acervo da coleção João Sattamini, a maior sobre arte brasileira depois da de Gilberto Chateaubriand exposta no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio. "Só não catalogamos tudo porque existem peças ainda em processo de doação", explica Maria Auxiliadora.

A exposição inaugural começa a ser montada no dia 25 de agosto, segundo o curador Reynaldo Roels. "A ideia e mostrar, em uma ordem mais ou menos cronológica, a abrangência da arte contemporânea brasileira", define o crítico e historiador de arte.

Na coleção Sattamini, estão nomes como Iberê Camargo, Antônio Dias, Roberto Magalhães, Jorge Guinle Filho, Lygia Clark, Di Cavalcanti e Hélio Oiticica. Serão 120 obras, uma de cada artista, com casos raros de mais de uma peça por autor. O restante fica guardado na reserva técnica.

Segundo Reynaldo Roels, o acervo é grande demais para o espaço do salão de exposições de mil metros quadrados. "O museu não deveria ter mostra permanente, mas sim várias temporárias se alternando. Isso permitiria que a coleção fosse estudada mais profundamente ao longo do tempo", sugere Roels.

Conselho - A direção do MAC ainda não está definida. O conselho consultivo vai ser composto por pessoas indicadas por Maria Auxiliadora Silveira, Oscar Niemeyer, Cláudio Valério Teixeira, João Sattamini e Ítalo Campofiorito.

Maria Auxiliadora adianta que serão fechados convênios para trazer mostras de outras cidades e países. O auditório, de 60 lugares, será usado para palestras, cursos e workshops, com a presença de alguns dos artistas do acervo, que poderão falar de seu trabalho. Haverá uma lojinha com souvenirs e serão promovidos espetáculos ao ar livre no pátio. O restaurante funcionará independente do museu que tem tudo para ser uma das principais atrações de Niterói.

Coleção reúne obra de Di Cavalcanti, Volpi, Iberê e Shiró




"A coleção de João Sattamini é representativa de toda a arte brasileira contemporânea desde os anos 1950", define Reinaldo Roels, curador das obras levadas para o MAC. Segundo Reinaldo, a exposição, com 120 peças, é bastante variada.

Até o início do próximo ano, outras obras da coleção de mil peças de Sattamini deverão ser expostas no MAC. "Como a coleção é bem vasta e ficará em cartaz por muito tempo, é possível fazer um revezamento, sem repetir nenhum título, até esgotar a coleção", diz o curador. Para ele, é difícil destacar qualquer peça. "Acho que o próprio conjunto da coleção é notável", afirma.

A arquitetura do museu vai facilitar a observação das peças. Com um grande salão central e dois corredores circulares, o visitante poderá ter uma noção da arte contemporânea. "O bom é que não temos labirintos ou salas escondidas", elogia Reinaldo.

Para o curador, os quadros em grande escala no salão central de artistas como Antônio Dias, Jorginho Guinle, Leda Catunda e Ivan Serpa - deverão ser os principais atrativos para os visitantes. As telas têm, em média, 3 metros de altura por 4 de comprimento.

A coleção de João Sattamini for iniciada nos anos 1960, reunindo as mais importantes correntes na arte do país, como a abstração dos anos 1950, o geometrismo, o concretismo e o neo-concretismo. Entre os autores, nomes consagrados como Iberê Camargo, Flávio-Shiró, Di Cavalcanti, Alfredo Volpi, Jorge Duarte, Lygia Pape, Mauricio Bentes e Farnese de Andrade.

Obra de Niemeyer flutua sobre a Baía de Guanabara

Oscar Niemeyer é um poeta do concreto. Nas suas curvas quase impossíveis, projeta sonhos. E o melhor é que realiza quase todos. Exultante com a proximidade da inauguração de um de seus últimos grandes projetos, Niemeyer comemora. "Estava na hora. O museu já saiu em muitas revistas lá fora e vários arquitetos do mundo inteiro vinham querendo conhecer", exulta o arquiteto, do alto de seus 89 anos de vida.

Falando enquanto esboça um croqui, ele explica a concepção de sua última travessura. "Quando vi aquele lugar, pensei em uma flor desabrochando sobre as águas. Fiz um apoio central e a arquitetura erguida como uma flor", conta.

Travessura, porque seus projetos ousados sempre dão muito trabalho na hora da execução. Segundo o prefeito João Sampaio, que também é arquiteto, quase tudo teve que ser encomendado especialmente para o museu.

Só de concreto, a obra consumiu 3,2 mil metros cúbicos, quantidade suficiente para a construção de um edifício de dez andares. Na pintura da parte externa foi utilizada uma tinta especial que serve como proteção para a chuva e o calor.

As esquadrias das janelas são preparadas para dilatação e os vidros - de dois centímetros de espessura - têm um filtro para não prejudicar as obras em exposição, sendo capazes de aguentar ventos de até 200 quilômetros por hora.

A praça do museu tem 2,4 mil metros quadrados e é onde fica o espelho d'água de mil metros quadrados que vai ser responsável pela mágica do ilusionista Niemeyer. O espelho fica em volta da base e vai refletir 36 lâmpadas de mil watts espalhadas em torno do edifício. Esse truque faz o museu parecer estar acima do seu nível real, o que dá a impressão de que o MAC está flutuando sobre a Baia de Guanabara.

"Vai parecer uma nave espacial sobrevoando o Rio, um disco voador visitando a cidade...", saboreia seu criador, com ares de moleque travesso vendo sua brincadeira dar certo.

Números

- Na construção do museu foram utilizados 3.200 metros cúbicos de concreto (o suficiente para levantar um prédio de 10 andares)

- Os janelões do MAC consumiram 70 lâminas de vidro triplex. Exclusivamente fabricadas para o museu, as lâminas têm 18 milímetros de espessura

- O piso interno do museu for revestido com 4 mil metros quadrados de carpete azul

- O MAC será iluminado com 36 faróis de avião, planejados para dar a impressão de que o prédio está dez metros acima do chão

- A subestação de energia do museu será alimentada com 800 quilowatts de força (o dobro da potência do equipamento usado no Theatro Municipal)

- As obras de arte serão iluminadas por 400 lâmpadas

- A pintura da parte externa do museu consumiu 100 baldes de tinta acrílica pura. A cúpula foi impermeabilizada e recebeu tratamento térmico com material altamente resistente - o mesmo utilizado nos foguetes da NASA

- Durante as escavações, foram retiradas 5.500 toneladas de terra no Mirante da Boa Viagem

- A estrutura do MAC é capaz de suportar um peso equivalente a 400 quilos por metro quadrado, além de ventos com velocidade de até 200 quilômetros por hora

Por Judith Moraes Renzi para o Jornal do Brasil, em 4 de agosto de 1996








Publicado em 13/02/2023

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