Aluna de grandes nomes das artes brasileiras, como Oswaldo Goeldi, Iberê Camargo e Darel Valença Lins, a gravadora, professora, cenógrafa e figurinista, Anna Letycia Quadros caracterizou-se pela inspiração expressionista, economia de traços, leveza das formas sólidas, uso criterioso de cor e pela leveza sugerida pelas formas sólidas. Na década de 1970, a artista criou uma oficina de gravura no Museu do Ingá, que por 21 anos tornou-se polo de criação, troca de experiências e ajudou a formar centenas de artistas de todo o país.

Nascida na cidade fluminense de Teresópolis em 1929, Anna Letycia inicia estudos de desenho e pintura com Bustamante Sá, na Associação Brasileira de Desenho, no Rio de Janeiro, e, na década de 1950, frequenta vários cursos de gravura, tendo como professores André Lhote, Darel, na Escola Nacional de Belas Artes (Enba), e Iberê Camargo, no Instituto Municipal de Belas Artes. Realiza curso de xilogravura com Oswaldo Goeldi, na Escolinha de Arte do Brasil, e de pintura com Ivan Serpa, com quem participa da criação do Grupo Frente. Nessa década, passa a trabalhar exclusivamente com gravura em metal.

Em 1959, frequenta o ateliê do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ), coordenado pela artista Edith Behring. É convidada a lecionar gravura no ateliê desse museu, atividade que exerce entre 1960 e 1966. Dentro desse período, dá aulas de gravura em Santiago, onde recebe o título de professor honoris causa da Pontifícia Universidade Católica do Chile, em 1961.

Na produção de Anna Letycia, a afinidade com a obra de Goeldi pode ser percebida no clima soturno de algumas gravuras e na ligação com o expressionismo. A artista utiliza frequentemente a imagem do caracol, motivo para geometrizações e múltiplas combinações formais, como em Caracol (1965), obra na qual, através das formas espiraladas, explora sugestões de positivo e negativo, claro e escuro, densidade e transparência.

A partir de 1968, inclui a caixa como novo elemento formal em suas obras, e como símbolo da dualidade interior/exterior. Em Caixa Voadora (1968) associa às formas espirais e cúbicas sugestões de motivos decorativos arquitetônicos. De uma produção inicial ligada a formas da natureza, a artista passa a criar obras abstratas, revelando constante pesquisa técnica e formal.

Em 1977, Anna Letycia instala em Niterói a Oficina de Gravura, no Museu do Ingá, que coordena até 1998. Pela criação da Oficina conquista o Prêmio Estácio de Sá, do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Não só estudantes interessados em gravura foram alunos de Anna Letycia: nomes como Alair Gomes, Aluísio Carvão, Rubem Grilo, Ronaldo do Rego Macedo e Analu Cunha passaram pela Oficina do Ingá, um ponto de efervescência cultural que fazia com que muitos artistas atravessassem a Baía da Guanabara.

A artista desenvolve ainda atividades de cenógrafa e figurinista, e atua principalmente em parceria com a diretora Maria Clara Machado. Em 1998, é publicado o livro Anna Letycia, de Angela Ancora da Luz, pela Editora da Universidade de São Paulo.

Entre as mais importantes exposições de Anna Letycia estão as realizadas no Salão Nacional de Arte Moderna, onde recebe o Prêmio Viagem ao País e o Prêmio de Viagem ao Exterior. Durante oito anos integra a Comissão Nacional de Belas Artes. Participa das Bienais de Paris, Veneza, Bienal de Gravura de Tóquio; Bienal de Gravura de Liubliana e realiza a retrospectiva Anna Letycia, no Paço Imperial do Rio de Janeiro; a Mostra Rio Gravura, no Espaço Cultural dos Correios; e a Bienal de Gravura de Macau, 2000.

Anna Letycia faleceu no Rio de janeiro em 30 de outubro de 2018, vítima de enfisema pulmonar, aos 89 anos.





Anna Letycia Quadros, por Cláudio Valério Teixeira

Não se poderia realizar uma exposição tão abrangente como esta (Niterói Arte Hoje, MAC Niterói, 2002), de artistas de Niterói, sem que fizéssemos uma homenagem a Anna Letycia. A partir de 1977, quando é fundada a Oficina de Gravura do Ingá, Anna Letycia torna-se profunda- mente ligada à vida artística e cultural da cidade, dedicando, generosamente, parte significativa de sua vida profissional ao ensino da gravura, formando gerações de artistas gravadores, e levando a Oficina do Ingá a ser reconhe- cida como um centro de referência nacional da gravura,

Desde Carlos Oswald, a gravura no Brasil é praticada por artistas dotados de personalidades ensimesmadas, noturnas, interiorizadas, possuidoras de um olhar introspectivo, qualidades decorrentes de seu ofício. O ato de gravar está implicitamente ligado a este caráter intimo, a um universo silencioso e solitário. Mas com Anna Letycia é diferente. Artista múltipla, além da gravura, dedica-se também à cenografia de teatro, tendo trabalhado com Maria Clara Machado. Carnavalesca, desenvolveu projetos para a Escola de Samba União de Jacarepaguá, no enredo em homenagem a Mestre Valentim.

Anna Letycia, como artista e mulher, corajosamente envolveu- se com as reivindicações da categoria, integrando comissões e associações de classe. Historicamente tem participado das lutas políticas quando mais se fazem necessárias, nunca fugindo de suas responsabilidades de cidadã-artista.

Discípula de Iberê Camargo, do mestre alemão Friedlaender e de Oswaldo Goeldi, Anna Letycia constrói sua obra marcada por provo- cante personalidade. Primeiramente, numa fase plena de figuração, saindo de sua prensa bichos e pássaros, onde encontramos "seus cinzas e pretos excelentemente matizados", como escreveu Mário Pedrosa sobre esse período. Mais tarde, Anna Letycia dedica-se aos caracóis e, sob a influência da abstração, sua arte torna-se mais livre e fluida, sem, contudo, perder o diálogo com a natureza. Surgem inscrições de formas orgânicas, plenas de vitalidade e ritmos que nascem com o ácido a corroer as chapas.

Hoje, quando a arte busca o novo pelo escândalo, quando a pesquisa for- mal é substituída pelo espetáculo, a contundência dramática e social pela simples atitude absurda, Anna Letycia continua a produzir sem trair sua vocação sincera de artista, fiel à gravura; sem trair a vida, fiel a si mesma.

Cláudio Valério Teixeira, 2002 - Presidente da Fundação de Arte de Niterói



Foto de capa, Leo Aversa (O Globo)


Exposições Individuais

1955 - Rio de Janeiro RJ - Individual, Galeria Dezon
1958 - Rio de Janeiro RJ - Individual, Galeria GEA
1960 - La Paz (Bolívia) - Individual, Galería Municipal
1961 - Santiago (Chile) - Individual, Centro Brasileiro de Cultura
1962 - Belo Horizonte MG - Individual, Museu de Arte da Pampulha;
1962 - Rio de Janeiro RJ - Individual, Petite Galerie;
1962 - São Paulo SP - Individual, Petite Galerie
1965 - Rio de Janeiro RJ - Individual, Petite Galerie;
1965 - São Paulo SP - Individual, Petite Galerie
1966 - Milão (Itália) - Individual, Centro Cultural Ítalo-Brasileiro
1968 - Lima (Peru) - Individual, Galeria Candido Portinari;
1968 - Paris (França) - Individual, Galerie Debret;
1968 - São Paulo SP - Individual, Galeria Ars Mobile
1969 - São Paulo SP - Individual, Galeria Ars Mobile
1970 - Paris (França) - Individual, Galerie Jacob
1972 - Belo Horizonte MG - Individual, Galeria da Escola Guignard;
1972 - Rio de Janeiro RJ - Individual, Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro
1975 - Brasília DF - Individual, Oscar Seraphico Galeria de Arte
1979 - Rio de Janeiro RJ - Individual, GB ARTe
1982 - São Paulo SP - Individual, Galeria Suzanna Sassoun
1983 - Brasília DF - Individual, Oscar Seraphico Galeria de Arte;
1983 - São Paulo SP - Individual, Galeria Suzanna Sassoun
1984 - Brasília DF - Individual, Oscar Seraphico Galeria de Arte;
1984 - Rio de Janeiro RJ - Individual, GB ARTe;
1984 - São Paulo SP - Individual, Galeria Suzanna Sassoun
1985 - Montevidéu (Uruguai) - Individual, Instituto de Cultura Uruguayo-Brasileño;
1985 - São Paulo SP - Individual, Galeria Suzanna Sassoun
1987 - Rio de Janeiro RJ - Individual, Galeria GB ARTe
1988 - Assunção (Paraguai) - Individual, Instituto Cultural Brasil-Paraguai
1989 - São Paulo SP - Individual, Galeria Suzanna Sassoun;
1989 - São Paulo SP - Individual, Centro de Estudos Brasileiros
1993 - Madri (Espanha) - Individual, Brita Prinz Galería
1995 - Rio de Janeiro RJ - Anna Letycia: gravuras, Escola de Artes Visuais do Parque Lage;
1995 - Rio de Janeiro RJ - Anna Letycia: gravuras, UERJ. Galeria Candido Portinari
1996 - Rio de Janeiro RJ - Anna Letycia: gravuras 1955-1996, Paço Imperial
1997 - Passo Fundo RS - Anna Letycia: gravuras, Museu de Artes Visuais Ruth Schneider
1999 - Rio de Janeiro RJ - Anna Letycia, Espaço Cultural dos Correios
2008 - São Paulo SP - Gravuras de Anna Letycia, Instituto Tomie Ohtake
2009 - Rio de Janeiro RJ - Individual, Marcia Barrozo do Amaral Galeria de Arte;
2009 - Brasília DF - Gravuras de Anna Letycia, Caixa Cultural


Com informações da 'Enciclopéia Itaú Cultural' e do Catálogo da Mostra 'Niterói Arte Hoje' (Mac Niterói, 2002)


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Publicado em 09/08/2023

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