A Fundação de Atividades Culturais tem novo presidente, o terceiro em menos de um ano. A professora de História da UFF, com curso de pós graduação no exterior, Ismênia Lima Martins, assume a presidência da FAC na sexta-feira, 30 de junho de 1978, em substituição a Jorge Gustavo da Costa, que vinha acumulando também a direção do Conselho de Desenvolvimento Municipal.
Desde 1º de junho de 1977, ocupou a presidência da FAC o empresário artístico Albino Pinheiro, que pediu demissão (no principio deste ano de 1978), levado pela pressão dos intelectuais de Niterói e também por não ser o cargo remunerado. Depois foi premiado com o cargo remunerado de Coordenador de Atividades Artísticas da Fundação, aumentando seu poder de decisão.
Segundo muitos agentes culturais da cidade, desde que foi criada pelo Prefeito Moreira Franco, em abril de 1977, como sucessora do instituto Niteroiense de Desenvolvimento Cultural (INDC), a FAC constantemente mergulha em crises e vem se caracterizando como uma entidade divorciada da cultura genuinamente niteroiense, insistindo em dar apoio sistemático aos grupos artísticos "importados".
Em um ano de funcionamento, nem mesmo o seu conselho deliberativo foi instalado e nada se fez para reativar o Museu da Cidade (que funciona no antigo prédio da Câmara de Vereadores) e o Centro Cultural Paschoal Carlos Magno, no Campo de São Bento.
Contra Albino Pinheiro, que acumula outras funções oficiais remuneradas, pesa a critica de que desde que se encontra na FAC, vem se preocupando em prestigiar grupos artísticos de Rio e de outras cidades, dando-lhes preferência na programação da fundação e na ocupação dos teatros Municipal e Leopoldo Fróes, marginalizando os artistas de Niterói. Contra ele existem ainda as criticas de "que raramente comparece ao gabinete de trabalho na FAC e de ser uma pessoa não aberta ao diálogo com os segmentos intelectuais da cidade".
A escolha da professora Ismênia Lima Martins foi bem aceita nos diversos segmentos intelectuais de Niterói. Porta-voz da Prefeitura garantiu que o Prefeito deu carta branca para agir à Professora Ismênia.
FAC reestruturada vai programar a arte niteroiense
Quando criticam a atuação da FAC, os intelectuais de Niterói observam que não são contrários aos espetáculos importados, como afirma o Maestro Silas Sias. "O que somos contra é quanto ao privilégio excessivo, em detrimento dos artistas de Niterói. Se a FAC apresenta, por exemplo, dez espetáculos nos dois teatros, dois ou três poderiam ser de grupos niteroienses. Ela poderia também, aproveitar a motivação que os grupos do Rio e outras cidades provocam no público, para levar este mesmo público aos espetáculos produzidos em Niterói.
A prioridade para os espetáculos artísticos de outras cidades nos dois teatros administrados pela FAC (Municipal e Leopoldo Fróes) foi justificada por Albino Pinheiro com as seguintes palavras: "Quanto mais cedo oferecêssemos espetáculos nos dois teatros, era melhor para Niterói, daí porque passamos, no inicio, a convidar os grupos do Rio e outras cidades". Essa prioridade também é justificada por Albino "porque Niterói não tinha grupos musicais e
teatrais profissionais, só amadores".
Ismênia cria o Conselho Deliberativo da FAC
A dinamização das atividades do Museu da Cidade e dos teatros Municipal e Leopoldo Fróes, a criação de mais salas de leitura e a conscientização do público de que "são suas as salas de cultura" estão entre os objetivos da nova administração da FAC. A nova diretoria da Fundação, Ismênia Martins, anunciou ontem em entrevista coletiva, os nomes dos 13 representantes do Conselho Deliberativo da Fundação entre pessoas expoentes em suas respectivas áreas e que tivessem profunda vivencia de Niterói".
Foram escolhidos Cristina Sibeira Rocha (comunidade), Domari Sposito (balé), Jardel de Azevedo Ferreira Júnior (área jovem intelectual), José Pedro Pinto Esposel (universidade), Márcio Goldman (área estudantil), Marcos Valdemar de Freitas Reis (escolas de samba), Maria Jacintha Trovão de Campos (teatro), Quirino Campofiorito (artes plásticas), Ricardo Miranda (cinema), Luis Antônio Pimentel (Instituto Histórico de Niterói), Jacy Freitas Pacheco (Academia Niteroiense de Letras) e Jayme Luna (fotografia). Os nomes escolhidos, segundo Ismênia Martins, são de especialistas em suas respectivas áreas e terão suas atribuições ampliadas, propondo sugestões e reestruturando programas.
O Conselho Deliberativo da FAC foi instalado um ano depois a criação do órgão pelo Prefeito Moreira Franco. A este, caberia a escolha dos nomes mas, num crédito de confiança, delegou na prerrogativa a professora Ismênia Martins aceitando plenamente sua indicação. A maioria dos escolhidos foi indicada por representantes de suas áreas em reuniões realizadas na FAC, como Domari Sposito, eleito pelos representantes de 12 academias de balé da cidade.
O Conselho Deliberativo funcionará estudando e aprovando (ou não) os projetos apresentados a FAC em seus diversos setores. O trabalho inicial deverá ser centralizado, mas não em termos absolutistas. "Quis criar um grupo de trabalho, que tivesse atuação intensa dentro da Fundação", afirmou. Por isso, a preocupação de acordo com o consenso da comunidade. Os únicos escolhidos diretamente foram Quirino Campofiorito, Maria Jacintha Trovão de Campos, Roberto Ricardo Duarte e José Pedro Pinto Esposel, "em torno dos quais já há um consenso geral. Na verdade, são nomes muito conhecidos e respeitados em suas áreas".
Embora a maioria das áreas ainda vá elaborar seus programas, já há algumas previsões. O Projeto Recontar será revisto, a partir de estudos de avaliação a serem realizados e deverá continuar, provavelmente em novas bases. Há também projetos de criação de novas Salas de Leitura popular, a exemplo da que já existe no Barreto, no Centro de Abastecimento, com uma média de 40 leitores dia. Os teatros serão utilizados para apresentação de grupos da cidade, mesmo que isso signifique prejuízo, como aconteceu com o Balé da Bahia, um espetáculo que compramos e com o qual não tivemos nenhum lucro. "Mas vale a pena", afirmou Ismênia Martins.
Artigo de Vera de Vives
Boa sorte. professora Ismênia Lima Martins nova presidente da FAC, que reside e trabalha em Niterói, que tem preciosa bagagem cultural, professora e pós-graduada em História que é, portanto pessoa capaz de perceber o que o povo daqui precisa e reclama, em termos de cultura.
O posto que ocupa não é dos mais fáceis de preencher, mas é desses onde, se nada existe, tudo pode ser criado, em muitos níveis. É preciso apenas saber como se faz a mágica. E da mágica o primeiro mandamento há de ser programar as coisa com meu povo, e aqui.
Não endosso o boicote a companhias e grupos artísticos de outras cidades. Arte não tem Estado e bairrismo tem hora, mesmo reconhecido como um sentimento sempre salutar. Venham pois os da outra banda da baía, os mineiros e os baianos, mas não venham só eles, não se limitem as oportunidades de quem aqui cria e produz, só porque não se está bem certo de que ou do quanto se pode esperar, de quem nasceu e vive em Niterói. É realmente falta de imaginação - e nesse erro têm sem cessar incorrido os empresários cariocas que sentaram praça na Prefeitura - é muita falta de imaginação deixar de programar grupos nativos porque eles não têm renome nacional.
O que, afinal, se deseja: o nome feito, para cantar a glória de ter trazido a esta cidade gente famosa; ou o trabalho de gerar condições para que naturais da terra se transformem em gente famosa? Qual o conceito de trabalho cultural dos empresários da FAC?
Eles não são daqui, não são de Niterói. Ponha isso em música, o seja como rima, como dá para cantar. Eles não são daqui, não sabem com quem estão falando, por isso não concretizaram as aberturas que todos esperávamos de uma Fundação. Jogaram no alienígena certo e consagrado. Não sabem quem é quem, por aqui. E podia ser diferente? Faltava-lhes o essencial, o ter pés no chão, e ter fundas raízes.
Condições que supomos em D. Ismênia. Não sendo marciana, há de saber por onde, e como, há de começar, pois há de lembrar que cultura não é só diversão, é crescimento, afirmação e definição do homem em si e em seu mundo.
Com informações de O Fluminense, em julho de 1978
Pesquisa e edição: Alexandre Porto
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