Iniciativa dos estudantes da cidade em prol da conclusão das obras da Biblioteca Pública de Niterói
Por iniciativa do Centro Acadêmico 'Evaristo da Veiga', da Faculdade de Direito de Niterói, reuniram-se, em princípios deste mês de maio de 1932, os representantes das instituições culturais e educacionais, literárias e congêneres existentes nesta capital, a fim de assentarem as bases de um movimento a ser realizado em prol da conclusão das obras do edifício destinado à Biblioteca Pública Estadual e sua respectiva instalação.
Nessa assembleia ficou assentada a remessa de um memorial nesse sentido, ao sr. interventor federal.
Esse documento, que foi redigido pelo bacharelando A. P.
Soares de Pinho, promotor do movimento, e que representou na reunião o Conservatório Livre de Música, é do teor seguinte e será levado ao chefe do governo estadual, logo que seja assinado por todos os delegados das entidades que se fizeram representar:
Exmo, sr. Comandante Ary Parreiras.
DD. Interventor Federal no Estado do Rio de Janeiro.
Os abaixo-assinados, representando o pensamento da intelectualidade e das classes conservadoras fluminense, pois que são delegados da maioria das entidades educacionais, científicas, literárias, culturais e comerciais que desenvolvem sua actividade nesta capital, vêm, data vênia, sugerir a v. exa. a inadiável necessidade da instalação de uma Biblioteca Pública, que venha colocar o Estado do Rio de Janeiro no mesmo pé de igualdade das demais unidades da Federação.
Como fluminense, tiveram os signatários a grata satisfação de ver a criação oficial de semelhante instituto, em 1927, e, como moradores desta cidade, o início da construção do prédio que iria abrigá-lo, tornando-o realidade.
Entretanto, os cálculos otimistas dos nossos dirigentes, que falharam, forçaram-nos a suspender os trabalhos de edificação do aludido prédio, depois de nele ter sido empregada quantia superior a 250:000$000.
Interrompida a obra, há mais de quatro anos, vem ele, a pouco e pouco, se deteriorando, enfeiando a mais bela praça da cidade e oferecendo, em consequência, uma deplorável impressão a quantos, nacionais ou estrangeiros, têm oportunidade de observar-lhes as ruínas, que caminham para a destruição completa e para a perda total dos capitais aí investidos. Essas são as razões, do ponto de vista material e estético, que nos induziram a oferecer à v. exa. a sugestão em apreço.
Num país como о nossо, a ideia do número avassalador de analfabetos já se integrou no pensamento coletivo, como sendo um dos seus característicos, tudo quanto se fizer pela instrução em qualquer das suas modalidades, tudo quanto, de alguma forma, possa concorrer para desmentir aquela noção, bem o sabe v. exa., será levado à conta de obra de são patriotismo.
A criação de uma Biblioteca Pública na capital da velha província do Rio de Janeiro, de tão nobres e brilhantes tradições, cidade onde vivem mais de 100.000 almas, onde existem 3 institutos de ensino superior, 1 de ensino técnico de ensino commercial, 1 conservatório de Música, 6 estabelecimentos de instrução secundária, 1 Escola Normal, além da população escolar subsidiária que aqui residindo, frequenta os educandários da capital vizinha: em uma cidade cujo comércio é representado por 4 associações de classe, sendo 2 patronais e 2 outras de seus auxiliares, em uma cidade que conta com as corporações culturais que a esta subscrevem a criação de uma Biblioteca Pública, repetimos, convenientemente aparelhada e provida, já não diremos de tesouros bibliográficos, mas de obras didáticas, científicas e literárias geralmente procuradas, justifica-se por si mesma. E o valor dessa iniciativa não escapa à esclarecida visão de Vossa Excelência.
Assim, sr. Interventor, existindo um prédio, que fôra destinado a esse fim, em condições de ser concluído; possuindo o Estado, segundo nos consta, cerca de 25.000 livros; e havendo pletora de funcionários nas repartições públicas; portanto, os 3 elementos imprescindíveis para a instalação de uma Biblioteca Pública, foi que nos ocorreu lembrar a v. exa. conveniência da concretização desse velho desejo das classes intelectuais fluminenses.
E se nos abalançamos a vir à sua presença num momento de angustiante crise financeira, foi porque tivemos conhecimento através da correspondência trocada entre v. exa. e o sr. secretário de Estado das Finanças, e divulgada na imprensa local, que vai o nosso Estado reaver da União Federal a vultuosa soma de 9:500:000$000, correspondente a impostos arrecadados do Porto de Niterói. Soubemos, também, que, por força de recente decreto governamental regulando o pagamento do imposto de transmissão de propriedade no caso de incorporação de imóveis para a constituição ou aumento de capital de sociedade anônima, vai ser canalizada para os cofres estaduais, dentro de poucos dias, quantia superior a 2.500.000$000, somente relativa a impostos em atraso.
Pelos boletins quotidianos publicados no 'Diário Oficial' temos notícia de que à disposição do Estado existe um saldo que monta a mais de 8.000:000$000.
E considerando que toda esse receita imprevista, bem como a melhoria das fontes de arrecadação ordinária, denota o inteligente esforço do governo de v. exa. para restabelecer o crédito do Estado do Rio de Janeiro, tão fundamente abalado nos últimos tempos; considerando, pois, que com essa orientação honesta e sadia o desvio de uma quantia, embora não pequena para aplicação em obra tão meritória e de tamanho vulto não vira causar grande abalo às convalescentes finanças estaduais, e considerando, finalmente, a messe de benefícios que esse sacrifício trará à terra fluminense, é que nos animamos a alvitrar a v. exa. a conclusão das obras do edifício destinado à Biblioteca Pública Estadual e a sua consequente instalação e franquia ao público.
Atendendo Vossa Excelência a esta sugestão, feita em nome da cultura fluminense, terá a certeza de deixar a sua memória indelevelmente gravada nas páginas da História do Estado do Rio de Janeiro.
Niterói, 6 de Maio de 1932
Seguem-se as assinaturas dos representantes de 17 instituições culturais e da Associação Comercial de Niterói.
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