Matéria publicada na Revista Guanabara Fluminense em maio de 1954

- Como se vem desenvolvendo o Museu Antonio Parreiras, que reúne, quatro coleções de arte, das mais valiosas do país.
- Uma visita à antiga residência do famoso mestre fluminense da pintura histórica e ao ar livre.
- Como se vai processando o levantamento, em todo pais, da obra dispersa de Parreiras, segundo a palavra do diretor do Museu.

O Museu Antonio Parreiras é uma instituição cultural de inegável projeção no País. Como todo museu moderno, está longe de ser apenas um depósito de quadros, conforme a velha conceituação que se fazia outrora das repartições desse tipo, para transformar-se no que é hoje: um centro vivo, dinâmico, de pesquisas no setor de sua especialização que são as artes plásticas brasileiras.

Quando não bastasse uma visita às suas galerias, instaladas à rua Tiradentes, 47, a leitura do primeiro Volume dos Anais do Museu, recentemente publicados, esclarece-nos amplamente à cerca do que tem sido as atividades daquela casa, não somente quanto ao estudo da obra de Parreiras, como também da de numerosos outros artistas brasileiros ou estrangeiros, ligados à terra e à cultura fluminense.

A obra dispersa de Parreiras

O representante da Revista Guanabara foi recebido no Museu pelo seu Diretor, nosso confrade Jefferson Avila Júnior, nome bastante ligado às artes plásticas nacionais, visto como foi desenhista e ilustrador, por largos anos, na imprensa carioca e é presidente da ABD. (Associação Brasileira de Desenho), com sede na cidade do Rio de Janeiro.

A nossa pergunta inicial foi sobre se o Museu, tendo sido criado para recolher a obra dispersa do Mestre Parreiras, já havia cumprido o seu "desideratum". E a resposta foi a seguinte:

"Efetivamente, o Decreto Lei que a fundou o Museu fala em recolher a obra dispersa de Parreiras, tarefa difícil senão impossível de realizar-se ao pé da letra. Pintor de história, o saudoso mestre fluminense executou quadros encomendados pelos Governos dos Estados de Pará, Paraíba, Pernambuco, Baía, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, prefeituras de Manaus, Belém, Rio de Janeiro, Niterói, São Paulo, Porto Alegre, etc., não se falando em numerosas aquisições avulsas, efetuadas pelo poder público de norte a sul do país. Todo esse considerável acervo dificilmente se poderia remover para Niterói e isto porque os interessados (governos estaduais e municipais), como é óbvio, reagiriam ante a perspectiva da redução dos seus respectivos patrimônios culturais.

"Há ainda duas razões - continuou - que, a meu ver, militam em favor da conservação dos quadros históricos de Parreiras nos lugares em que se encontram. A primeira é que composições daquele gênero, como sejam "A Conquista da Amazônia" (Belém, Pará); "Primeiros passos para a Independência do Brasil" (Salvador, Bahia); Fundação de Santo André e de São Paulo (na capital bandeirante"; República de Piratini" (Porto Alegre, Rio Grande do Sul) e outros, rememorando e celebrando episódios da história regional, exercem, nos lugares em que se encontram, uma função cultural que o tempo já se encarregou de consolidar. Perturbar ou interromper essa função não me parece louvável nem patriótico.

A outra razão, não menos ponderável, decorre da circunstância de serem esses quadros verdadeiras mensagens da cultura fluminense, fazendo-a lembrada nos palácios governamentais, bibliotecas, escolas, etc. de diversos Estados e cidades importantes do país.

As aquisições de quadros obedecem a determinado critério.

Indagamos então como procede a direção do Museu para cumprir a finalidade da repartição. E a resposta foi a seguinte:

"Tomamos, para ponto de partida de nossos planos e pesquisas, a obra em conjunto do Mestre, realizada entre os anos de 1883 e 1937, isto é, da data de sua matrícula na Imperial Academia de Belas Artes, na Corte, a de seu falecimento em Niterói. Dividimos, para estudos, é claro, esses 54 anos de atividade profissional em cinco fases assim distribuídas: a primeira de 1883 a 1887, de sabor francamente realista, por influência de seu professor George Grimm; a segunda entre os anos de 1888-1889 com tendências acentuadas para o Impressionismo; a terceira, de 1890 a 1896 de feição, digamos, "nacionalista", caracterizada pelo estudo intensivo da paisagem brasileira; a quarta entre os anos de 1897 a 1905, de reação surpreendentemente romântica, e, finalmente, a ultima fase, que vai de 1906 até o fim da vida do artista. Essa última fase revela-nos, na sua plenitude, o artista fortemente individual que foi Parreiras, acima das escolas, das tendências ou dos "maneirismos" do seu tempo."

"O nosso objetivo tem sido o de recolher às galerias do Museu as obras mais representativas de cada uma dessas fazes. Para isso estamos levantando, em todo país, o censo artístico das obras do Mestre, tarefa sem dúvida demorada, como é de imaginar-se. Quanto às aquisições estas só se efetuam quando os proprietários dos quadros que nos interessam concordam em deles de desfazerem, o que não é comum, pois uma boa obra de arte é sempre capital valorizado, patrimônio que vai passando de pais para filhos, através de muitas gerações."

Poucas, mas valiosas, as doações até agora recebidas pelo Museu

"Mas as nossas coleções não têm sido enriquecidas apenas por via de aquisições. Já conseguimos provocar algumas doações e por sinal que bem valiosas. Do professor Oswaldo Teixeira, diretor do Museu Nacional de Belas Artes, obtivemos a cessão de duas grandes peças, uma representativa da Primeira e outra da segunda fase; da Prefeitura de Niterói, devidamente autorizada pela Câmara Municipal, conseguimos a cessão de um quadro (retrato do senador Martins Torres) representativo da quarta fase e de Deccleciano Martins de Oliveira, artista festejado e magistrado na Justiça do Distrito Federal, um "estudo" a carvão, que se inclui na quinta fase.

Estamos nos referindo até aqui à "Coleção Antonio Parreiras", que é o patrono da Casa. O Museu, porém, reúne em suas galerias outras coleções e entre elas quero destacar a dos "Artistas Contemporâneos", a qual tem recebido algumas doações igualmente valiosas, como sejam: do ilustre pintor Manoel Santiago a paisagem "Terezopolis"; da professora Georgina de Albuquerque o quadro "Retrato da Viúva Antonio Parreiras"; do Sr Onestaldo Penafort uma pintura de Pinto Bandeira; do pintor Armando Leite ume interessante marinha intitulada "Pedra do Bem-te-vi" e do pintor Francisco Acquarona um carvão de Pedro Peres, como autografo de Vitor Meirelles.

As coleções do Museu reúnem objetos de arte e documentos

O repórter manifestou a sua estranheza ante a distinção que o diretor fazia entre "Coleção Antônio Parreiras" e "Coleção Artistas Contemporâneos", pois supunha, e esta é uma crença generalizada, que o Museu possuísse apenas uma coleção de quadros: a do insigne paisagista niteroiense. O esclarecimento veio em seguida:

"Na verdade, só de objetos de arte, o Museu possui nada menos de quatro coleções distintas, com todas as suas peças fichadas e catalogadas. São elas as seguintes: "Antônio Parreiras", reunindo o acervo do artista, acrescido de aquisições e doações, num total de 230 peças; antiga "Coleção Particular", reunindo trabalhos de pintores nacionais e estrangeiros que pertenceram ao Mestre, num total de 61 peças; "Coleção Artistas Contemporâneos", que se desenvolve de ano para ano com os "premio-aquisições" dos salões oficiais da Associação Fluminense de Belas Artes e que já conta com 74 peças; e, finalmente, "Coleção Alberto Lamego", que é a antiga pinacoteca dos Airises, com um total de 40 peças.”

Esta última Coleção é sem dúvida uma das mais ilustres do país, pois reúne pinturas e desenhos das escolas Francesas, Italiana, Holandesa e Flamenga do século XVII, além de alguns bem valiosos trabalhos de artistas brasileiros do século XIX. Essas são as coleções, propriamente de arte, existentes no Museu. Mas convém lembrar que elas são complementadas com a organização e exposição ao público de coleções de objetos diversos e documentos que ajudam a melhor compreender e sentir as coleções de arte.

Conclusões gerais

O repórter colheu ainda informações quanto à data da fundação do Museu, por Decreto-Lei do antigo interventor federal, Ernani do Amaral Peixoto, em janeiro de 1941 e das diversas obras de adaptação por que a Repartição tem passado desde que abriu as suas portas ao publico no ano seguinte de 1942. A frequência tem sido animadora, contando-se por centenas o numero de embaixadas culturais (visitas coletivas) que tem percorrido as suas galerias.


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Publicado em 10/12/2021

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