"A João Pinto, o perfeito amador teatral, Presidente do Clube Dramático Fluminense, por ele fundado em 1905 com o nome de Éden Clube Fluminense, homenagem dos seus admiradores".
Esse é o texto da placa com a qual, a 16 de maio de 1945, o Theatro Municipal João Caetano e admiradores homenagearam João Pinto Rodrigues Junior, que começou sua trajetória artística num modesto teatrinho infantil.
Ator, cantor e diretor, considerado o Rei dos Amadores Niteroienses, João Pinto atuou por mais de 60 anos nos diferentes palcos da cidade, além de atuar em diferentes teatros cariocas, entre eles, o Municipal do Rio de Janeiro, ao lado de reconhecidos amadores e profissionais, como Leopoldo Fróes, Dulcina de Morais, Castro Viana, Átila e Conchita de Morais, Estefânia Louro, Costa Velho, Martins Teixeira Júnior, Irênio Coelho, Júlia e Ismênia dos Santos, Osório da Silveira (o "Osório Leiloeiro"), Carlos Couto, Zezé Macedo e muitos outros.
Filho de João Pinto Rodrigues, um bem sucedido comerciante, dono da Padaria Recreio, localizada na rua da Praia, depois Visconde do Rio Branco nº 201, nasceu em Niterói a 2 de abril de 1884 e foi aluno do Lyceu Niteroiense.
Num domingo, 24 de maio de 1896, com a idade de 12 anos, fez a sua estreia no
Chateau Desireux, modesto teatro dirigido pelo maestro
Guilherme Ribeiro Brito Fernandes, localizado na rua Visconde de Itaboraí, 60A, que mantinha uma conceituada trupe infantil. A récita teve como destaque o vaudeville "Durval, o Aventureiro", de autoria de Brito Fernandes, com 35 números musicais. A 4 de agosto, vive o Rei do Inferno, na peça "O Viveiro de Satanás", também do diretor do grupo.
Pisa o palco do Theatro Municipal de Niterói a 3 de junho do ano seguinte no espetáculo 'A Conquista de um Trono', também de autoria de Brito Fernandes, que contava com 36 crianças no palco. Em junho de 1899 volta ao Municipal na opereta 'Joanico', do maestro
Francisco Assis Pacheco, atuando ao lado de
Irênio Coelho,
Martins Teixeira Júnior,
Ismael Maia,
Francisco Bastos,
Belinha Pereira da Costa e
Leopoldo Fróes.
Placa localizada no Theatro Municipal de Niterói | Foto do ator em 'A Revista', 1922
Após sua recriação em 1905, preside o
Niterói Clube que estreou no Theatro Municipal com a ópera "Milhões do Sr. Conde", original das irmãs Neomísia e Cecília de Oliveira, com música do maestro
Eduardo Souto. João Pinto foi muito aplaudido vivendo o papel de Herótides. No mesmo ano, desliga-se do Niterói Clube para criar o
Éden Clube, estreando com a peça "Batalha das Damas", original de Ernest Legouvé e Eugène Scribe.
Sua atuação na opereta em 4 atos "Jorge, o Grumete", com música de Eduardo Souto, no papel do Comandante Negreiros, foi elogiada em 'O Fluminense' pelo temível crítico Arlindo de Castro, o Arcas, que a ele sempre se referia com elogios, quer como galã, quer como barítono: "Ao sr. João Pinto coube indubitavelmente as honras da noite. Possuidor de uma belíssima voz, foi sempre muito feliz, fazendo-se bisar na aria do 4º ato, que cantou com muita vida e expressão. A parte dramática foi satisfatória, notando-se apenas um cacoete de declamação que o consciencioso amador fará desaparecer rapidamente."
Decaindo essa associação, promove sua fusão com o
Clube Fluminense, onde pontificavam
Eduardo Souto e
Maurício Helmold, formando, no início de 1906, o
Éden Fluminense Clube.
A fusão não deu certo e João Pinto acompanha
José Carlos da Costa Velho na criação do
Cassino Dramático, que estreia no Municipal a 13 de novembro de 1906 com "Joanico", um clássico para os amadores de Niterói. No Cassino, João Pinto reencontra antigos colegas de palco como Irênio Coelho, Francisco Bastos, Ismael Maia e
Luiz Leitão. Em março de 1909, com Eduardo Souto, Maurício Helmond,
Augusto Cruz e
Eurico Brandão, reorganiza o
Clube Fluminense, que estreia a 14 de agosto com o drama "Tosca".
No ano seguinte, com antigos colegas do Cassino Dramático e do Clube Fluminense, funda o
Cassino Fluminense, do qual foi diretor de cena. Estreia a 20 de agosto no Theatro Municipal, subindo à cena, "Jorge, o Grumete".
Em 1912, novamente com Costa Velho, recria o Cassino Dramático que recebe, em agosto, a dama do teatro nacional
Ismênia dos Santos no palco do Municipal, para representar em "O Dote", de
Arthur Azevedo. Em 1916 atua como cantor na
Sociedade Sinfônica Fluminense, sob o comando do maestro
Cordiglia Lavalle.
A partir desse ano começa a ser aproveitado em companhias profissionais em cartaz em Niterói, atuando ao lado de Machado Careca (João Machado Pinheiro Costa). A experiência levou-o a mais uma vez reorganizar o Cassino Fluminense, com o nome de Núcleo Artístico Brasileiro (NAB), abrigando profissionais da Companhia Ismênia dos Santos, entre eles
Armando Duval,
Júlia dos Santos e
Ismeninha (Ismênia Duval dos Santos), depois rádio atriz de renome. Novamente com o Eden Club volta a dividir o palco com Ismênia em diversos espetáculos.
Com a morte de Ismênia em 1918, o NAB muda o nome para
Núcleo Dramático Ismênia dos Santos e trabalha assiduamente no Theatro Municipal e nos cineteatros Rio e Politerpsia, ambos na Avenida Visconde do Rio Branco, em Niterói.
Ainda em 1918, atua na Companhia de Medina de Souza, mas logo interrompe a carreira e muda-se para o Sul do Estado, como funcionário do Moinho Barra Mansa. Transferindo-se para o Moinho Fluminense, retorna a Niterói e retoma as atividades teatrais, ingressando na
Companhia Ismênia dos Santos, agora dirigida por Armando Duval, onde já estavam Átila,
Conchita de Moraes e
Dulcina de Moraes.
Em 1925, vendo que o amadorismo definhava, reune os antigos companheiros na recriação do Éden Fluminense Clube, com pouco sucesso. Insistiu na iniciativa em 1928, em 1932, novamente sem muito êxito, porque a invasão dos teatros e cineteatros pelas revistas e burletas asfixiava os movimentos amadores. João Pinto encarava também uma renovação nos palcos, já que, enquanto uma reconhecida geração de amadores começava a abandonar os palcos, uma nova ainda não se consolidava. E, no fundo, João Pinto acabou sendo uma ponte entre elas.
Clube Dramático Fluminense
Com o advento do estado novo o governo federal passa a patrocinar grupos dramáticos, por meio da criação do Serviço Nacional de Teatro. João Pinto reanima-se e funda o Clube Dramático Fluminense (CDF), dividindo os ensaios com Mauro de Almeida. Com a cooperação do
Conservatório Livre de Música de Niterói, integra o novo grupo os artistas
Edmundo Kelly,
Mário de Almeida,
Carlos Andrade,
José Guimarães,
Azevedo Gomes,
Júlio Nunes e
Carlos Castro, entre outros.
A trupe estreia no Theatro Municipal com a ópera cômica portuguesa, em 3 atos "O Solar dos Barrigas", de autoria de João da Câmara e Gervásio Lobato, música do maestro Cyriaco Cardoso. Encenaram peças que fizeram sucesso tanto em Niterói como no Rio de Janeiro, entre elas 'Pivete', de Luís Iglésias; 'Onde canta o sabiá', de Gastão Tojeiro; 'A Vida é um Sonho' e 'Manhãs de sol', de Oduvaldo Viana, mas especialmente 'O Mártir do Calvário', de Eduardo Garrido, carro-chefe das Semanas Santas, dominando absoluto no papel de Pilatos.
Forma no CDF uma verdadeira escola de atores, de onde saíram, entre outros, Luís Delfino, Zezé Macedo, Carlos Couto, Inês de Castro, Waldir Nunes, Luís Teixeira, Roberto Miranda, Ísis de Oliveira, Íris Fróes, Bárbara e Paulo Piola, Paulo Renato e Moacir Deriquém.
Além de sua atuação no CDF colaborou como ensaiador no grupo de teatro do Clube Canto do Rio (1936) e do Teatro dos Universitários Fluminenses (1942), quando dirigiu 60 estudantes na peça "Sonho de uma Noite de Primavera", entre eles
Lyad de Almeida. Lyad se tornou um dos maiores incentivadores do teatro niteroiense e foi, em 1967, o primeiro presidente do Instituto Niteroiense de Desenvolvimento Cultural (INDC), hoje Fundação de Arte de Niterói (FAN).
Em 1939 João Pinto começa a atuar no teleteatro na Rádio Clube Fluminense, com Renato Lacerda. Em 1943 foi fundador e tesoureiro da Federação Fluminense de Amadores Teatrais, que chegaria a instituir em Niterói a
Escola Fluminense de Teatro e Cinema, ambas com sede no Theatro Municipal de Niterói. Dividiram espaço e projetos com o Conservatório Livre de Música, então dirigido pelo
maestro Felício Toledo.
Em setembro de 1946, o Dramático promove uma homenagem em suas bodas de ouro como ator, levando à cena "O Homem que não Soube Amar", comédia em 3 atos de Ferreira Rodrigues. Em dezembro de 1956 atua na Companhia de Comédia de Odilon Azevedo, que fez temporada no Theatro Municipal de Niterói.
Possivelmente o ator que mais vezes tenha atuado no Theatro Municipal de Niterói, João Pinto pisou naquele palco pela última vez em dezembro de 1960, aos 74 anos, como diretor-geral no espetáculo "Jurema". O Clube Dramático Fluminense, que presidiu até 1958, quando foi substituído por Daniel Gonçalves, fechou as portas com sua morte, ocorrida em Niterói a 22 de julho de 1961.
Entre os papeis desempenhados por João Pinto ao logo de sua trajetória, destacam-se: Paulo Normand, em "Menina do Chocolate"; Viscont Nelivrae, das "Alegrias do Lar"; Ângelo, do "Dote"; Henrique, da "Batalha de Damas"; Cavaradossi, da "Tosca"; Fernando, da "Rosa do Adro"; Luiz Fernandes, da "Morgadinha"; Guilherme, da "Bastilha"; Pilatos, do "Martyr do Calvario"; Marquês, dos "Sinos"; Brissac, dos "Mosqueteiros" etc.
O célebre escritor e dramaturgo
Carlos Couto, com quem contracenou no CDF, disse certa vez: "No dia em que se fizer um livro sobre gente que serviu Niterói, João Pinto voltará à lembrança dos que o aplaudiam, sorridente como em 'Manhãs de Sol', político como em 'Pilatos', ou cômico como em 'As Visitas'".
Fontes: Gazeta de Notícias; O Fluminense; Jornal do Commercio; A Noite; e 'Epigrafia do Teatro Municipal de Niterói', de Emmanuel de Macedo Soares (1992).
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