05 de outubro de 1991

Quando o Prefeito Jorge Roberto Silveira me levou para ver o lugar onde será construído o Museu de Arte Contemporânea de Niterói, eu senti que ali, diante daquele panorama magnífico, seria possível realizar uma bela obra de arquitetura.

Estávamos num pequeno promontório, num platô debruçado sobre a Baía de Guanabara, dele se descortinando, ao longe, as montanhas barrocas do Rio.

Era uma tarde morna de mar sereno, com águas e morros se diluindo nos azuis da atmosfera, como uma velha aquarela de Debret.

E lá ficamos alguns minutos, calados, como se a natureza tão bonita exigisse um pouco de silêncio e contemplação.

O projeto me atraía, e passei logo a imaginar o museu como qualquer coisa solta na paisagem, um pássaro branco a se lançar sobre o céu e o mar de Niterói.

Não desejava um museu envidraçado, mas com o grande salão de exposições cercado de paredes retas, circundado por uma galeria que o protegendo permitisse aos visitantes nos momentos de pausa apreciar a vista extraordinária.

Deixei o térreo livre de construções, localizando as áreas de trabalho, direção, recepção etc, no primeiro piso e, no subsolo, o restaurante e a reserva técnica. E utilizei o núcleo central como ligação direta entre esta última e o salão de exposições.

Dois dias depois, como meu amigo Italo Campofiorito, Secretário de Cultura, levei ao prefeito o meu projeto, que ele, jovem e dinâmico, adotou com entusiasmo. E ficamos muito tempo a conversar detalhes do museu, a melhor maneira de conduzir a construção etc.

Contei-lhe então como esse projeto me interessava, constituindo para mim uma volta ao passado, a Maricá, onde nasceram meus avós Ribeiro de Almeida. Que lá, em Maricá, meu avô fora juiz de paz muito tempo, transferindo-se depois para o Rio, onde, como Ministro do Supremo Tribunal Federal, ficou o resto da vida.

E lhe disse que de Niterói pouca coisa conhecia. Conversas de família, uma fazenda no Lagarto, minha avó a contar que mandava seu empregado comprar camarão em Ponta Negra e eu a frequentar mais amiúde essa cidade, descansando numa velha casa de fazenda, presente dos meus amigos Lyli e Horácio de Carvalho, ou acompanhando Darcy Ribeiro, que nos fins de semana ia ver a construção da sua casa de praia.

E lembrei vários amigos que ali moravam, como o escultor Honório Peçanha e o casal de pintores Hilda e Quirino Campofiorito, artistas de talento, progressistas contentes agora com certeza, vendo que Niterói se renovava no caminho das artes e da cultura.

Gentil, Jorge Silveira levou-me para conhecer melhor a cidade. E a correr praias e morros, surpreso com tanta beleza, confiei-lhe minha vontade interior de um dia morar em Maricá. Uma ideia estranha que sempre me invadia e só os mistérios da vida podiam explicar.

OSCAR NIEMEYER, 83, arquiteto, projetou obras em Brasília e trabalhou, entre outros países, em Israel, Líbano, Argélia, Gana, Cuba, EUA, Venezuela, Inglaterra, Portugal, Itália e França.








Publicado em 01/03/2023

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