(Memória, 06 de dezembro de 1988)
Proprietária desiste da venda e sonha com um centro cultural
Mais uma vez a ilustre proprietária do Solar do Jambeiro, a historiadora Lúcia Figueira de Melo Falkenberg, vai tentar transformar os seus oito mil metros quadrados de área verde em um grande centro cultural. A ideia não é nova, como não são novas as sucessivas tentativas de vender o solar. Ontem, enquanto os objetos estavam sendo leiloados por Paulo Brame, Lúcia desistiu de vender também a casa e o terreno, insatisfeita com os lances: o mais alto de CZ$ 450 milhões, não chegou sequer à metade do valor inicial, estipulado em Cz$ 1 bilhão.
Ainda sem ter ideia do total arrecadado com a venda dos objetos, a proprietária garantiu que toda a renda apurada será investida na formação da empresa Jambeiros Promoções Culturais para levar em frente o projeto do centro. Lúcia conseguiu vender no leilão a grande maioria dos 174 lotes de objetos, entre peças dinamarquesas, móveis de jacarandá e de pinho de riga e quadros a óleo - só o do pintor Antonio Parreiras foi vendido por Cz$ 12 milhões.
Além da questão do valor, a venda do prédio e do terreno enfrenta também o problema do tombamento. Na manhã de ontem, o diretor regional do Sphan (Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), Fernando Burmeister, enviou à proprietária um pedido de adiamento do leilão, argumentando que a Secretaria tem preferência para a compra do imóvel tombado.
Fernando Burmeister pediu prazo de um mês para avaliar as condições de aquisição do solar. "A lei determina esse direito de preferência. Não fomos sequer consultados sobre esse leilão", disse o diretor do Sphan, acrescentando que, até o final da tarde, não sabia da realização.
Para Lúcia Falkenberg, "a venda do solar se tornou impossível, quase uma fantasia". Quando viu que o lance mais alto tinha ficado em Cz$ 450 milhões, acenou para o leiloeiro comunicando sua decisão de desistir da venda. "O centro cultural", disse, "é uma ideia antiga que nunca foi viabiliza da por falta de verba e de apoio. Com a venda desses objetos, acredito que conseguirei realizar esse velho desejo de ver o solar com as portas abertas para a cultura".
Uma bela arquitetura colonial
Escondido por árvores centenárias que lhe deram o nome, o Solar do Jambeiro, casarão em estilo colonial tombado em 1971 pela Sphan, é a maior atração do bairro de São Domingos, em Niterói. Além dos pés de jambo, seus 8 mil metros quadrados de terreno, cercados por grades que vieram da Inglaterra, são cobertos por mangueiras, cerejeiras, limoeiros, abieiros e Jaboticabeiras.
Revestida de azulejos, com telhas longas e beiral portugueses, vidraças azuis e brancas originárias do Porto, portas e janelas guarnecidas de granito-do-reino e coloridas bandeiras de vidro, a mansão da Rua Presidente Domiciano divide-se em 14 quartos, cinco salões, cozinha, banheiros e quatro quartos para empregados. No jardim há um viveiro de plantas ornamentais e belas estátuas de mármore representando a Liberdade, a Caridade e a Lealdade.
No piso de tábuas corridas da varanda, balas de canhão são um registro da Revolta da Armada, em 1918. No salão, entre pesados móveis de cerejeira e jacarandá, destaca-se um armário dinamarquês de 1650. Mesas senhoriais, pias incrustadas nas paredes, pesados lustres e desbotados tapetes espalham-se pelos cômodos de teto trabalhado. Uma escada torneada leva ao segundo pavimento, com enormes quartos avarandados, armários, lavatórios e camas do século passado.
O Solar do Jambeiro foi construído em 1872 por Bento Joaquim Alves Pereira, um português que nunca morou na casa. O primeiro morador foi o médico Júlio de Magalhães Calvet. Em 1887, o pintor Antonio Parreiras foi hóspede da mansão, comprada em 1892 pelo diplomata dinamarquês George Christian Bartholdy. Com as frequentes viagens de Bartholdy, o Solar foi alugado várias vezes.
Durante seis anos abrigou concertos, conferências e exposições, como sede do Clube Internacional de Niterói. De 1909 a 1915 funcionou ali o Colégio das Irmãs Dorotéias e finalmente, em 1916, o casarão foi reocupado pela família Bartholdy, que lhe deu a suntuosa decoração conservada até hoje.
Jornal do Brasil
Foto sem data
Tags: