Em 20 de setembro de 1830, o periódico "Voz Fluminense" publicou carta de um leitor que assinava "Brazileiro", na qual narra o espetáculo que havia presenciado na Casa da Sociedade Dramática do Theatrinho, localizada no Vallonguinho, que abrangia a rua da Imperatriz até o Largo da Memória. A Casa da Sociedade fundada pelos amadores Joaquim Antonio Carreira Bacellar, Alexandre Pinto de Carvalho, André de Moura Velho e Victor Porphirio Borjas, localizava-se no exato endereço onde hoje se encontra o Theatro Municipal João Caetano. Trata-se de um registro do nascimento do teatro niteroiense.
Sendo o Dia 7 de Setembro o primeiro dia memorando nos Fastos do Brasil; Dia o mais agradável aos olhos de todos os Brasileiros, verdadeiros amigos de sua pátria e liberdade; nada há mais justo do que cada fração do povo, que compõem a Heroica Nação, manifestar por externos sinais de regozijo, o quanto desejam celebrar tão almo dia, em cada aniversário da nossa feliz Independência.
Na Villa Real da Praia Grande, deu-se uma indubitável prova de patriotismo a Sociedade do Theatrinho, nos esforços que fez, para nesse, nunca assaz plausível dia, louvar à cena uma das melhores peças, ainda ali não representada, e um muito aparatoso Elogio Dramático alusivo ao mesmo objeto. Porém justos motivos a obrigaram a transferir o espetáculo para o dia seguinte, 8 de setembro de 1830.
À hora do costume, reunindo-se a Sociedade e seus convidados naquele recinto, ricamente adornado, depois de uma bem executada sinfonia, deu-se princípio ao Elogio, que depois terminou com a brilhante aparição do Busto de Sua Majestade Imperial. Imediatamente apareceu na cena uma menina de nove anos ricamente vestida com as cores do Pavilhão Nacional, a qual depois de recitar a Quadra abaixo transcrita, lançou sobre o Busto uma chuva de odoríferas flores.
QUADRA
"Desculpai, ó Heroe sem par no mundo,
Da vossa infante subdita a ousadia;
Pois vem agradecer os bens, que destes
À recente Nação, neste almo dia."
Findo este ato, o diretor do Theatrinho, postado à frente da plateia, entoou os seguintes "Vivas" que foram recebidas com o maior entusiasmo por todos os espectadores de ambos os sexos, que tinham decorado seus peitos com ramos de café, e folhas da árvore chamada Independência, e aplaudidas em altas vozes, acompanhadas de nuvens de flores, que saíam da tribuna das senhoras, dirigidas ao Imperial Busto.
"Viva S. M. I., Viva a Independência do Brasil, Viva a Nação Brasileira, Viva a Constituição, e indo a dar o último Viva à Augusta Assembleia Legislativa, acudiram mais duas vezes ao mesmo assunto. Findos os Vivas, rompeu a Orquestra o Hino Nacional, que foi entoado por um Sócio, que na cena representava a figura do Brasil, acompanhado em coro pelos espectadores.
Depois do Elogio, seguiu-se a Peça
"O Bom Amigo", drama em dois atos do dramaturgo português Antônio Xavier Ferreira de Azevedo, que tendo sido por muitos inconvenientes, mal ensaiada, tal foi o entusiasmo dos Sócios representantes, que deixaram a Sociedade cheia de satisfação.
No fim do primeiro ato, foram lançadas da tribuna para a plateia diversas obras poéticas impressas das que tinham aparecido na cidade na noite do dia 7 de setembro; e em manuscrito um Elogio feito pelo Sócio M.J.M., que por estar caracterizado para a cena, não o pode repetir da plateia.
Os intervalos da Peça foram preenchidos com árias acompanhadas de piano, e concertos, entre este, e a Orquestra. Há muito para notar-se a decência, a tranquilidade e a satisfação que se conservou durante este espetáculo.
Adaptado de "Voz Fluminense", 20 de setembro de 1830 - Pesquisa realizada por Alexandre Porto.
António Xavier Ferreira de Azevedo (Lisboa, 6 de março de 1784 — Lisboa, 18 de janeiro de 1814) foi um poeta dramático e comediógrafo português. Assinou algumas obras simplesmente como A.X.F.A. ou António Xavier. Foi um prolífico e respeitado poeta dramático, autor de algumas das peças mais apreciadas nos teatros portugueses e brasileiros das primeiras décadas do século XIX. É autor de mais de uma centena de dramas e farsas, entre originais e adaptações de textos francesas e espanhóis, recriados ao gosto do público português. Muitas das suas peças nunca foram publicadas enquanto outras apenas o foram algumas décadas após a sua morte aos 29 anos de idade, por atores e de pessoas ligadas ao teatro.
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