Raras vezes uma associação pôde registrar vitória tão completa como a que ontem, 6 de agosto de 1898, alcançou o Club Dramático Assis Pacheco, realizando a sua récita de inauguração.
O Theatro Municipal, ornamentado com bandeiras e escudos alegóricos, estava repleto de associados; quer na pista, quer nos camarotes (em número de quarenta). Nas galerias nobres, notava-se a escolhida sociedade niteroiense.
Francisco Assis Pacheco, o laureado maestro e presidente do clube, às 8h30 empunhou a batuta e durante toda a récita a orquestra ouve-se com muita disciplina.
Foi representado o espirituoso
vaudeville O Lobo e o Cordeiro em quatro atos, do ator e dramaturgo Pedro Augusto. A ação desenrola-se em Niterói e na Capital Federal. A parte musical, para os ensaios, foi confiada ao distinto maestro
Brito Fernandes, sendo a música da lavra do distinto maestro Assis Pacheco, o qual é diretor geral.
Juvenal Cordeiro (
Pedro Augusto), que mora na Praia Grande, porque os alugueis são mais baratos, tem uma filha, Alice (
Thereza Pereira da Costa), que não quer casar-se com Almeida (
Martins Teixeira Junior), tipo esquisito e maduro, preferindo Armando Lobo (
Júlio Picotes), um poeta.
Há na casa uma criada, um azougue, chamada Maria (
Isabel Pereira da Costa) que favorece o namoro, ao lado do seu bem amado João, criado lapuz português (
Francisco Bastos), do Antonico Crioulo (
Mario Continentino) e do cozinheiro José (
Sylvio Moreira). Alice em uma noite de festa combina fugir com o namorado e realiza a falcatrua.
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Maestro Francisco Assis Pacheco em foto de 1892 |
Há cenas muito engraçadas; termina o ato com o "Coro dos Tamancos", convidados que trazem embrulhados os tamancos, porque não estão dispostos a pagar passagem de 1ª classe nas barcas.
Chico Peteca (
Irênio Coelho) é tio de Armando e no 2º ato, em casa deste, há um sarilho enorme, cheio de quid pro quo chistoso em que o Chico ficou envolvido; é um bom tipo de fazendeiro mineiro. A polícia intervém: o Delegado (
Francisco Bohasec) não toma conhecimento do rapto e prende aquela gente toda, como jogadores.
O 3º ato é na Delegacia; ali passam-se bons episódios; notando-se cenas longas que se tornam monótonas por isso mesmo.
Atravessa a peça um exemplar de jornalista, Anselmo Guerra (
Annibal Furtado), personagem mal desenhado. É um tipo exótico, estúpido, alcoviteiro, ignorante e gago; exemplar esse que não se encontra na imprensa fluminense. Só é aplicável aos que se dizem da imprensa e que não passam de intrusos. A este Anselmo, o inteligente e hábil autor batiza como jornalista e por vezes alude com certa acrimônia a imprensa, principalmente quando fala o Delegado.
Por fim a coisa arranja-se pelo melhor: Casam-se os namorados que se raptaram; o jornalista - o deboche da peça - é posto na rua à pontapés.
O desempenho estava bom, desculpado um ou outro senão sem importância. Os amadores sustentaram com grande unidade e na mesma afinação, salvo um ou outro deslocado.
Maria, a grisete, um diabrete inteligente, teve na simpática senhorita Izabel Pereira de Costa, conhecida na intimidade por Belinha, uma intérprete como só a uma artista de mérito é dado desempenhar. Irênio Coelho no papel de Chico Peteca foi um sucesso legítimo. Francisco Bastos no criado e Martins Teixeira Junior no Almeida conquistaram o primeiro plano.
Pedro Augusto é um artista e um homem de merecimento; se mais não fez foi devido à moléstia de que está sofrendo. D. Thereza Costa, Annibal Furtado, Mario Continentino, Sylvio Moreira, Júlio Picotes, Francisco Bohasec e os coros deram bom desempenho aos papeis.
Os autores do poema e da música foram vitoriados constantemente, desde o final do primeiro ato, recebendo no fim do espetáculo, os amadores, a diretoria e autores entusiástica ovação.
Assis Pacheco fez 12 números lindos e leves; o dueto do quarto ato é um mimo; foi repetido três vezes e muito bem cantado por Isabel Pereira da Costa e Francisco Bastos. Os coros dos tamancos e dos apitos agradaram sobremaneira.
No elenco: Irênio Coelho, Martins Teixeira Júnior, Orlando Teixeira, Antônio Bastos, Francisco Bastos, Annibal Furtado, Mario Continentino, Julio Picote, Antônio Alves, Sylvio Moreira, Francisco Bohaeck, Mário Souto, além das sinhoritas Thereza Pereira da Costa, Francisca Pereira de Costa, Isabel (Belinha) Pereira da Costa, Dinorah Pereira da Costa, Anna Guerra e Mme. Glória Banto.
Foi uma noite cheia; as impressões que aqui deixamos representam a cotação geral da seleta sociedade que assistiu e aplaudiu à inauguração de um clube que promete ter longa vida, pois não lhe faltam elementos seguros para prosperar.
Pode-se, pois, considerar esta associação ao gênero de operetas e comédias a que se dedica, como a primeira desta cidade; pelo que damos parabéns a todos os associados e um bravo aos admiráveis rapazes do corpo cênico e diretoria pela vitória prestes a alcançar.
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