Quando a cortina do palco se abrir para início do espetáculo da noite de 2 de maio de 1966, o Theatro Municipal João Caetano, estará iniciando uma nova fase na sua história de tão gloriosas tradições.
Longo e árduo foi o trabalho que tiveram os operários, artífices e administradores da Prefeitura, juntamente com outros de firmas empreiteiras, para restituir à nossa cidade uma casa de espetáculos digna de sua população.
A Administração Municipal dedicou seus esforços e recursos nesta obra, que possibilitará a Niterói assistir às melhores manifestações da arte e da cultura nacional e internacional.
A recuperação desta Casa, incorporada ao patrimônio do teatro brasileiro, era mais do que uma aspiração geral; constituía um dever e uma obrigação para a municipalidade, que procuramos e conseguimos cumprir.
Niterói, 2 de maio de 1966.
Emílio Abunahman, prefeito de Niterói
Programa Oficial, Segunda-feira, 02 de maio de 1966
20h15 - Reabertura Oficial do Theatro Municipal João Caetano
20h30 - Solenidade de entrega dos "Cartões de Prata"
21h00 - Apresentação de "Mulher Zero Quilômetro", de Edgar G. Alves, pela Companhia André Villon
O Espetáculo
O atrito provocado pela presença de um desinibido marginal entre gente postiça e bem falante, é a anedota básica de 'Mulher Zero Quilômetro', representada por Cecília, a promotora rica, inteligente e vitoriosa, mas com a sensação permanente de que lhe falta alguma coisa, que ela finge não saber o que é.
'Mulher Nota Zero Km' é só a incursão da família Silva à prateleira de cima. Não é uma intenção de levar os Silva até o mundo macio do agenciador de automóveis, de senhora contumaz nos amores da sobrinha da Tia Ritoca, dos sketches judiciários. É antes um puxão para baixo, de modo a mostrar ao pessoal da arquibancada, os pequenos macetes dos sócios-proprietários.
Do autor
"Ao tentar escrever 'Mulher Zero Quilômetro', imaginei fazer uma paródia do conflito que surgira no convívio obrigatório entre uma jovem que até os 28 anos não conhecera outros homens, além de Duguit, Savigny, Papiano, Ulpiano e um desinibido marginal aparecido inesperadamente na sua vida, com toda a autenticidade de quem não tem muito a perder.
Apareceram logo dois personagens que tinham muito a perder, um corretor de automóveis e uma esfuziante senhora de muitos amores. Ao terminar o 2º ato surpreendi-me torcendo escandalosamente pelo vagabundo. Afinal, percebi que ele queria alguma coisa e todos nós, quando queremos de verdade alguma coisa, não respeitamos muito as regras do jogo.
Foi minha intenção verificar até que ponto se aproximavam os quatro personagens: o marginal João Silva, a intelectual Cecilia e os outros dois aproveitadores da "prateleira de cima". Para isso, tive de mostrar as pequenas falcatruas de uma classe que afoga em uísque, suas decepções.” Edgard G. Alves
Ficha Técnica
Comédia em 3 atos de Edgard G. Alves
Direção: Floriano Faissal
Elenco: Daisi Lúcidi (Cecília), André Villon (João Silva), Raul da Matta (Maurício), Ayrton Valladão (fotógrafo), Sandra Menezes (Izabel).
Dramaturgia: Edgar G. Alves
Cenário: Aquino Silva
Figurinos: Armando
Contrarregra: Eduardo Santos
Iluminador: Pedro Silva
Administradora: Odyla Araújo
Secretário: José Policena
Reforma e melhoramentos - 1966
Em julho de 1965 iniciou-se a reforma do Theatro Municipal João Caetano abrangendo todos os setores que vai desde a fachada até o porão da ribalta.
Toda a parte externa do prédio, inclusive a parte ampliada, recebeu pintura em tinta plástica na cor cinza. A fachada foi revestida com tinta plástica igualmente cinza sendo as inscrições e armas municipais em branco. A cobertura sofreu substancial reforma com a substituição de telhas por telhas de eternit, na parte de camarins.
A cantaria e as portas principais foram totalmente recuperadas, recebendo o passeio público aplicação de cacos de cerâmica.
O saguão de entrada, as salas laterais e escadarias ganharam piso de mármore branco, com rodapé preto, e as paredes, revestimento em mármore plástico emolduradas a gesso. As portas que dão acesso à plateia foram substituídas por portas acolchoadas com revestimento de napa perola emoldurada com madeira Gonçalo Alves. O teto foi rebaixado com material acústico, recebendo 12
spotlights de luz indireta e apliques de belíssimo efeito, além de novas instalações para a chapelaria e bilheterias.
Interior
A plateia, frisas, camarotes e geral sofreram total remodelação com aplicação de plastipiso numa área de 1.000 m2, revestimento das colunas em Jacarandá encerado; pintura das paredes com tinta plástica; colocação de cortinas em todas as portas, janelas e vãos; instalação de 40 ventiladores giratórios convenientemente distribuídos em todo recinto; montagem de 2 dispositivos de prevenção contra incêndio; equipados com mangueiras de 5 metros e 16 extintores de emergência interna, estes até então inexistentes. Dos 17 novos gabinetes sanitários construídos e instalados nas diversas dependências do teatro, 10 foram reservados exclusivamente para o público.
As escadas de madeira existentes foram substituídas por concreto, revestida de marmorite, e a iluminação tornada indireta com a instalação de 58 decorativos apliques nas paredes. Os ornatos das frisas, camarotes e geral foram decorados e patinados a ouro sobre fundo pêssego, e o peitoril revestido com napa acolchoada, formando um conjunto de requintado luxo.
Também, a belíssima decoração do teto foi totalmente restaurada e o lustre centenário de 48 luminárias cuidadosamente recuperado em toda sua plenitude de arte e beleza.
Mobiliário
As poltronas da plateia foram substituídas por modernas e confortáveis poltronas de cor creme, num total de 356 lugares. As cadeiras simples das frisas e camarotes, totalizando 220, foram trocadas por cadeiras estofadas de igual cor. A galeria foi altamente beneficiada, passando a ter poltronas estofadas e a sua capacidade ampliada para 100 lugares, com a construção de um praticável.
Os camarins foram ampliados com a construção de prédio lateral, em concreto armado, ganhando também conjunto mobiliário inteiramente novo e moderno.
Palco
Importante e substancial melhoramento foi introduzido no palco, com a instalação de uma rotunda de 20x6 metros com cúpula para concertos; colocação de um novo pano de boca; revestimento da ribalta em Jacarandá encerado; instalação de novos conjuntos de iluminação, com capacidade para 1.000 lâmpadas de efeito a cores; substituição de todas as cordas de sustentação dos cenários, totalizando 2 mil metros de material consumido; instalação de um circuito de telefones internos.
Sistema Elétrico
Reconstrução da cabine central e renovação de toda rede elétrica agora concentrada e distribuída em três painéis, com o total de 90 circuitos, permitindo controle direto de todo sistema elétrico interno e externo do teatro, bem como equilíbrio na distribuição de energia para os diversos serviços, oferecendo perfeita segurança para o operador, trabalho esse que consumiu 4.000 metros de fios e equipamentos diversos.
Foi também substituída a antiga aparelhagem de som por um novo e possante sistema de alta fidelidade, apropriado para grandes auditórios, com 20 colunas sonoras e estação central de transmissão semelhante as rádio difusoras.
Administração
A Administração, localizada no lado direito do palco teve sua secretaria convenientemente projetada, com aquisição de mobiliário novo, construção de um moderno balcão revestido em fórmica com proteção de vidro fantasia; construção de um gabinete para o Diretor do Theatro; substituição do forro de papelão por laje revestida de material acústico; aplicação de plastipiso em toda área; e acabamento de madeira de belíssimo efeito decorativo.
Bar
Com a moderna instalação em fórmica, inclusive armários; revestimento das colunas de sustentação em cerâmica azul e branca; aplicação de piso plástico; rebaixamento do teto em material acústico e iluminação fluorescente; instalação de uma geladeira comercial de grande capacidade e demais utilidades necessárias no serviço, o bar está preparado para atender com absoluta eficiência e presteza a todos os frequentadores.
Almoxarifado
O almoxarifado, além de ter suas instalações ampliadas, ganhou um amplo guarda roupa e melhoramentos no sistema de conservação de cenários, sendo o piso totalmente revestido com cerâmica vermelha.
Área Externa
Toda a área externa do teatro foi calçada com cacos de cerâmica nas cores preta, amarela e vermelha, totalizando 270 m2 de área pavimentada, tendo sido recuperados os três bancos de mármore Carrara trabalhado, e construídos dois longos canteiros para jardim.
O arrojado empreendimento do Prefeito Emilio Abunahman, que vem de restituir à cidade uma casa de espetáculo teatral de requintado luxo e dotada de aparelhamento técnico dos mais modernos, dispendeu Cr$ 154 milhões em materiais e serviços de empreitada, acrescidos de Cr$ 42 milhões em mão de obra, o que dá para aquilatar a importância dessa obra que oferece aos niteroienses um Teatro capaz de satisfazer as exigências da arte, do progresso e do conforto de nossa cidade.
História do Theatro Municipal João Caetano
Quando em 1839 o presidente da Província do Rio de Janeiro, Paulino José Soares de Souza, depois aclamado como Visconde de Uruguai, autorizou, pela Lei nº 140, de 12 de abril daquele ano, o ator
João Caetano dos Santos a construir um Theatro Provincial em Niterói, iniciava-se um capítulo à parte na história da Imperial Cidade de Nictheroy , antiga Vila Real da Praia Grande, repleta de fatos interessantes e originais.
Naquela época, segundo o escritor campista Múcio da Paixão, já existia um teatro em Niterói, instalado em 1827 pelos senhores Joaquim António Carreira Bacelar, Alexandre Pinto de Carvalho e André Moura Velho, que eram diretores dessa primeira sociedade dramática, sob a denominação de
"Sociedade do Theatrinho", e localizada no mesmo terreno do nosso atual Theatro Municipal, na então rua da Imperatriz.
Em 1833, tendo João Caetano deixado a Corte e vindo para Niterói, auxiliado pelos poderes públicos, ocupou o "Theatrinho", estreando em 2 de dezembro desse mesmo ano, data que representa, para muitos historiadores, a inauguração da primeira companhia teatral brasileira.
No ano seguinte, foi a Casa foi vendida a Joaquim Antônio Ferreira, em 1835 passou a se chamar
"Theatro Nictheroiense" e em 1840 foi comprada pela Sociedade Philo-Dramática.
Com a aprovação do Decreto 273, de 11 de maio de 1842, que renovava o contrato de 21 de abril de 1839, João Caetano obteve a propriedade do antigo Theatro, procedendo a sua completa reconstrução e inaugurando-o a 15 de dezembro do mesmo ano, com a denominação de "Theatro Provincial Santa Thereza", uma homenagem à futura Imperatriz do Brasil, Theresa Cristina.
Um episódio original ocorreu nessa época, segundo relato de
Arthur Azevedo, numa crônica que publicou em "A Noticia", de 21 de julho de 1904: João Caetano, que estava no apogeu da fama e do talento, sendo empresário do Theatro São Pedro, da então vizinha capital, obteve uma subvenção dos cofres provinciais para dar um espetáculo por semana em Niterói. Toda a sua companhia vinha do Rio, inclusive os músicos, transportada numa Falua especial que João Caetano tinha à sua disposição.
O grande ator, entretanto, não era fiel observador do contrato que o prendia a Niterói. Pressionado pelas autoridades, e para não perder o direito à subvenção, foi obrigado, certa ocasião, a levar à cena uma peça num dia de tremendo temporal. Apesar da chuva, toda a companhia atravessou a Baía de Guanabara, não faltando um único elemento.
Em Niterói, o tempo estava ainda pior e a peça foi representada para um espectador somente. Em meio à representação, João Caetano perguntou ao solitário assistente se não se importava que parasse a encenação. E o espectador não vacilou em responder: "Pode, estou aqui apenas me resguardando da chuva..."
Depois de um longo período de atividades e do falecimento de João Caetano, o Santa Thereza teve as suas portas fechadas, sendo depois demolido pela Companhia criada pelo maestro italiano
Felício Tati, que inaugurou, em agosto de 1884, o novo prédio como hoje conhecemos, mas ainda com o nome de Santa Theresa.
Encampado pela província, foi reinaugurado com reformas e ampliações em 1889. Vendido em hasta pública, autorizada pela Lei nº 198, de 6 de dezembro de 1895, comprou-o a Câmara Municipal, em junho de 1896, por 45.000$000. Em 1900 ganhou o nome de
Theatro Municipal João Caetano.
João Caetano foi, inegavelmente, um gênio do Teatro Brasileiro em sua época. Durante toda sua vida dedicou-se à arte teatral. Tendo sido o iniciador da nacionalização da ribalta, que teve por berço o Theatro que hoje tem o seu nome.
De 1904 a 1959, o Municipal sofreu várias reformas, todas com vistas a assegurar uma estabilidade e higiene, no que se destacaram como as mais importantes as realizadas nas administrações dos Prefeitos Paulo Alves, Enéas de Castro, Gustavo Lyra e Alberto Fortes.
Em dezembro de 1962 a Comissão de Segurança e Prevenção Contra Acidentes da Prefeitura Municipal de Niterói condenou as instalações do Teatro, que ainda assim funcionou precariamente até 1964.
Tendo como Prefeito o Dr.
Emilio Abunahman, em julho de 1965, iniciou-se a total e grande reforma por que passaria o Theatro Municipal, cuja vultosa obra teve a sua inauguração marcada para 2 de maio de 1966, com a encenação da peça 'Mulher Nota Zero Km', de Edgard G. Alves, pela companhia André Villon.
Texto reproduzido do Programa oferecido pelo Theatro ao público. Algumas imprecisões históricas foram corrigidas na edição.
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