Foi uma verdadeira apoteose o espetáculo realizado anteontem, 04 de setembro de 1900, no Theatro João Caetano pela Companhia dos já muitos conhecidos empresários Pepa Ruiz e Silva Pinto. Está dito tudo!

Também o nosso Theatro jamais recebeu em seu seio tanta gente. A lotação foi esgotada, não ficou um só bilhete na casa, muitas famílias voltaram para os seus lares por falta de bilhetes!

Representou-se o "Rio Nu", a legendária revista-comédia do festejado escritor brasileiro Moreira Sampaio.

Há quatro dias que os maquinistas da Companhia trabalhavam sem descanso no preparo da caixa do Theatro. Vimos as grandes obras feitas no porão e entre elas uma grande escavação para a montagem de um maquinismo que infelizmente não pôde funcionar a contento dos empresários.

Tal fato explica-se facilmente: Há tempos o mar encobria completamente o local em que está hoje construído o Theatro e daí qualquer escavação que se faça no terreno, a água surge em quantidade e com tal fato não contavam os maquinistas da empresa. Mas o publico não percebeu a falta e os aplausos delirantes foram a prova mais cabal de que a Pepa Ruiz e sua trupe tinham lavrado mais um tento no torrão nictheroyense.

A companhia apresentou-se entre nós com toda a pompa e esplendor. Os cenários mais ricos, os vestuários os mais fascinantes, foram todos transportados para o Theatro João Caetano que foi verdadeiramente pequeno, para acomodar todo aquele material.

Dito isto vamos analisar o desempenho da revista que esteve impecável.

Comecemos pela Pepa, a rainha formosa, a soberana por excelência, estrela radiante que fulgura no céu azul da arte. Pepa alcançou como sempre um ruidoso sucesso. Desempenhou com a graça que lhe é peculiar vários papéis: telefone, leiteira, banhista, Lusbelino, criada, vendedora de angu, etc. O público fez lhe ruidosa manifestação, atirando-lhe flores, chamando-a muitas e muitas vezes à cena.

Maria Alonso também um astro de primeira grandeza, mereceu do público os mais francos e entusiásticos aplausos.

A encantadora atriz cujo talento já é por demais comprovado encarnou-se nos papéis de Tan-tan, Cocote e cor-azul, uma cor-azul que nos deslumbrou a vista, que nos fez recordar a serenidade do céu, deste céu misterioso que se estende por sobre as nossas cabeças e que nos arranca do íntimo d'alma um grito de mais ampla admiração.

Ismênia Matheus deu-nos uma Dolores provocante e graciosa, um verdadeiro tipo de argentina que não é familiar. Maria Lino conseguiu conquistar a simpatia da plateia nictheroyense. Pudera, ela é tão ladina, possui tantos atrativos que encantam, conhece o segredo de vibrar na alma do espectador este afeto que nos embriaga, que nos confunde, - a admiração. E assim a formosa "Imigração" conquistou mais uma coroa de louros.

Ana Manarezzi, caiu no maxime da sogra como ninguém. Ai, se todas as sogras fossem tão engraçadas e tão bondosas como a Manarezzi... O público aplaudiu ruidosamente a galante atriz.

Anna Leopoldina, Estephânia, Felicidade, e as demais atrizes cujos nomes nos falham à memória houveram-se com muita habilidade e são dignas de todos os elogios.

Entre os homens destacamos:

Brandão (João Augusto) que é o Brandão, o Brandão e mais o Brandão!! Para que dizer mais? Quem por ventura negará o trabalho gigantesco do querido ator no papel de Rio de Janeiro. Nós não encontramos mais adjetivos no dicionário! Que nos perdoe o Brandão!

Serra é um ator de mão cheia e dentro em breve será um dos nossos primeiros galãs cômicos. Pinto... não há quem possa com ele nos tipos que necessitam de certa observação. O carroceiro, o padeiro e o caixeiro do frege encontraram no Pinto um intérprete fiel, um artista inimitável.

Nóbrega também desempenhou bem todos os papéis, bem como Irineu, bom satanás, João Silva, diversos papéis, Miranda, Afonso de Oliveira, e outros cujos nomes nos esquecemos que muito cooperaram para o bom desempenho da peça.

A orquestra, sob a direção do maestro Capitani, esteve magnífica. Segunda-feira próxima Subirá pela última vez no Theatro João Caetano o "Rio Nu".

Não é mais preciso recomendação. Os nomes de Silva Pinto e Pepa Ruiz são reclames os mais ruidosos. Uma braçada de flores à Companhia do Recreio Dramático.

Com informaçõs da Coluna 'Pelos Bastidores', de MTJ, em 'O Fluminense' (06/09/1900)
Pesquisa e edição de Alexandre Porto.


Pepa Ruiz

Pepa Ruiz
Espanhola de nascimento e radicada no Brasil, Pepa Ruiz (1859-1923) foi a primeira grande vedete do teatro de revista à portuguesa, onde estreou em 1875. Sua carreira esteve ligada desde cedo ao grande empresário, ator e dramaturgo português Sousa Bastos, com quem viveu e trabalhou ininterruptamente durante aproximadamente vinte anos. Para além de encabeçar, entre 1902 e 1923, os elencos de algumas das maiores produções musicais do movimento de independência do teatro brasileiro - face ao domínio europeu do século dezenove -, a atriz protagonizou a obra-prima "A Capital Federal" do jornalista e dramaturgo maranhense Artur Azevedo. Pepa Ruiz foi diversas vezes homenageada no Brasil antes de sua morte, em 1923, com 63 anos."

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Publicado em 18/11/2021

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