Realiza-se hoje, 15 de março de 1900, no Theatro Municipal, o espetáculo em benefício da primeira atriz dramática,
Helena Cavalier, que, por motivo de força maior, foi transferido. Esse espetáculo, verdadeira festa artística, é um acontecimento que deve encher de júbilo o nosso respeitável público apreciador insigne do que é bom em matéria teatral.
Niterói, terra essencialmente dramática, deve sentir-se satisfeita por poder registrar na sua longa história teatral mais um sucesso artístico, como promete ser essa peça.
A nossa profecia baseia-se no que presenciamos no ensaio a que, por convite dos nossos amigos Paiva Junior e Castro Vianna, assistimos no Theatro do Club Riachuelense. A peça escolhida é
Suplício de uma mulher, do dramaturgo francês Alexandre Dumas Filho.
Ainda que o conjunto não estivesse, como está, afinadíssimo, bastava, para garantir o sucesso, o trabalho extraordinário de Helena Cavalier na 4ª cena do 2º ato em que é arrebatadora, tocando às vezes ao sublime, tal o cunho dramático, artisticamente medido, que dá à mulher que luta com a vergonha, o arrependimento e à honra, à vista da realidade.
Essa artista que justamente consideramos, e como nós, todo o público, a primeira galã dramática do teatro brasileiro se não tivesse apresentado outras criações que imortalizaram-na, bastaria o desempenho que dá a essa soberba
Mathilde de Dumas. Esse trabalho é uma verdadeira concepção.
Ao lado de Helena, temos o nosso amador
Castro Vianna que a secunda com toda a galhardia na cena violentíssima, que se segue ao belo monólogo a que nos referimos. Castro Vianna, que é uma revelação artística, torna cada vez mais firmes os foros de primeiro amador de que presentemente goza, conquistados à custa de muito estudo, observação e amor à arte.
Em um papel altamente antipático, teremos o nosso
Paiva Júnior, amador distinto, portador de um nome ilustre e vitoriado na arte dramática. Minorando a má impressão dada pelo caráter do personagem que o Paiva interpreta irrepreensivelmente, vê-lo-emos no galã-cômico do
Capricho feminino acompanhado de
Maria Augusta e
Sousa Pomi. A primeira apresenta-se no
Suplício em um papel ingrato, como se diz nos bastidores.
A beneficiada, para mostrar-nos uma variante de seu pujante talento, fará também o papel de
Ignês em "Amor Por Anexins", o soberbo trabalho de nosso compatriota
Arthur de Azevedo, que nela encontrou a intérprete.
Foi uma noite deliciosa a que passamos assistindo a esse ensaio e aqui consignamos a recepção gentil e tratamento lhano de que fomos alvo por parte da distinta diretoria do Club Riachuelense, a quem patenteamos aqui o nosso agradecimento.
Aí fica pois o incentivo ao nosso público de fino paladar literário e habituado ao que é bom e que se orgulha de ter possuído amadores do pulso de
Alberto Victor a quem ainda chora com saudades e que era, incontestavelmente, o nomo primeiro amador; como
Gregório Dutra, que é recebido entusiasticamente todas as vezes que nos dá a honra de se apresentar em palco; de
Costa Velho, discípulo de Alberto Victor;
Castro Vianna,
Paiva Junior,
Osório da Silveira e tantos outros que seria ocioso enumerar.
O nosso público, caritativo e amigo dos artistas deve correr ao Theatro Municipal, levando à Helena Cavalier a animação de sua presença, a recompensa de seu sacrifício e reconhecimento pela gentileza do seu procedimento, ombreando-se no palco com amadores nossos.
Fazendo votos para que a beneficiada seja coroada do melhor êxito antecipadamente damos parabéns ao público pela esplêndida festa artística, que deixará no espírito dos assistentes benéficas recordações e a satisfação íntima de terem assim cumprido um dever de humanidade e civismo.
Serviço
Suplício de uma mulher
Data: Quinta-feira, 15 de março de 1900
Local: Theatro Municipal João Caetano
End: Rua XV de Novembro, 11
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