"O Dr. Paulo Alves, prefeito de Nictheroy, é hoje, no Brasil, o maior amigo do teatro e o mais sincero, o mais entusiasta, o mais independente."

    Com esse tom ufanista, assim iniciou Arthur de Azevedo a descrever, em artigo publicado no jornal "O Paiz", de 18 de julho de 1904, a reinauguração do Theatro Municipal João Caetano, após as obras lideradas pelo então prefeito, que hoje dá nome a uma das principais ruas do bairro do Ingá, em Niterói. Azevedo presidiu a cerimônia realizada no dia 15 daquele mês. Prefeito nomeado pelo então governador Nilo Peçanha, Paulo Alves (1850-1908) ficou à frente da prefeitura no curto período de 10 meses, de 5 de janeiro a 18 de outubro de 1904.


Continua Azevedo:

"Para mostrar o que ele vale, a providência fê-lo prefeito da capital de um Estado completamente arruinado pela incúria e pela politicagem, e o seu primeiro cuidado, ao assumir as respectivas funções, é mandar reconstruir um velho teatro abandonado, cujas paredes resistiram por milagre aos bombardeios dos revoltosos de 93, e de cuja existência já ninguém se lembrava.

Houve logo quem estranhasse que o prefeito, antes de mais nada, cuidasse do teatro; mas ele provavelmente respondeu, lembrando que, se o Estado do Rio de Janeiro chegou à ultima escala da penúria, não foi por ter feito o menor sacrifício com a arte, que não lhe custou um níquel.

A reconstrução do teatro andou, aliás, por uma soma insignificante, e do próprio rendimento do edifício conta o prefeito tirar o preciso para manter uma escola, que dará fatalmente os mais belos frutos, se a esse esforço digno e inteligente do administrador, corresponder a boa vontade de uma população inteligente e digna.

Nomeado pelo governador Nilo Peçanha, Paulo Alves (1850-1908) foi prefeito de Niterói de janeiro a novembro de 1904.
Foi uma bela festa a da inauguração desse teatro, presidida, não por mim (quem sou eu?) mas por João Caetano, que ali figurava em efigie, e cujo espírito pairava misteriosamente no ambiente elegante e alegre, onde outrora o seu talento brilhou com tanta intensidade.

Salvador de Mendonça, na sua prosa simples e sonora, trouxe para o palco do velho Santa Thereza o vulto majestoso do grande ator brasileiro, e falou dele com a certeza de quem outrora o viu com aqueles olhos que hoje infelizmente já não veem. O insigne homem de letras fez o elogio, não desproporcionado, mas justo, do interprete brasileiro de Shakespeare, e deu-lhe a palma, a ele, ao nosso patrício ignorado e obscuro, depois de compará-lo a outros grandes artistas que viu aqui e no estrangeiro. Mas a afirmação definitiva do gênio de João Caetano encontrou-a Salvador de Mendonca, principalmente, na interpretação do papel de Augusto, da tragédia de Corneille, a chave de ouro com que o imortal artista fechou uma carreira que foi, não há duvida, um dos mais curiosos fenômenos que apresenta a história do teatro em todos os tempos e em todos os países.

Depois que falou Salvador de Mendonça, ergueu-se o Dr. Paulo Alves e leu algumas tiras de papel em que traçou com o maior esmero literário, com um desrespeito sublime das fórmulas oficiais, com uma fé ardente de convencido e um entusiasmo de moço, entusiasmo sagrado e comunicativo, que eletrizou a plateia, os camarotes e as galerias, o seu modo de ver o teatro, que considera uma necessidade pública tão urgente como outra qualquer.

A memória de João Caetano, cujo nome fez figurar no frontão do teatro de Nictheroy, a tradição histórica daquela casa, o antigo esplendor da Praia Grande, tudo isso o preocupa e o fortalece.

João Caetano foi ator e empresário no Theatro Santa Thereza, nome original do espaço que hoje o homenageia.
O theatro - e naquele tempo não havia as barcas da Cantareira - era, na época de João Caetano, o elo que mais aproximava as duas capitais uma da outra; o salão do Theatro Santa Thereza era o ponto em que a sociedade carioca se encontrava com a sociedade fluminense. Por que não há de reviver essa época? Pois a travessia da maravilhosa Guanabara não é ainda um dos nossos mais belos passeios? Se em Nictheroy nos derem a boa comédia, tão difícil de plantar no Rio de Janeiro, por que não levaremos a Nitheroy o concurso da nossa animação, o estímulo dos nossos aplausos?

Entretanto, o digno prefeito nictheroyense, não apela para os cariocas; está convencido que basta a população da outra banda para fazer com que vingue a sua generosa e patriótica ideia de levantar a arte dramática. Em todo o caso, é uma lição, uma grande lição, que nos dá essa municipalidade pobre.

No Rio de Janeiro sucederam-se na prefeitura não sei quantos grandes homens, e nada fizeram em favor do teatro, dispondo, aliás, para esse fim, do produto de pesados impostos criados expressamente para a fundação do Theatro Municipal. Chegou por último o Dr. Pereira Passos e abriu concorrência para a construção de um monumento que só pode servir para óperas ou peças de grande espetáculo. A comédia está irremissivelmente perdida.

O prefeito de Nitheroy, sem dinheiro, sem recursos, sem elementos de quaisquer espécie, sem outro incitamento que não seja o da sua consciência de artista, recompõe um teatro onde as musas de Martins Penna se acharão à vontade, cria uma escola de arte dramática e promete ao país um núcleo de artistas de onde poderá sair, quem sabe, outro João Caetano, que foi mestre de si mesmo.

Ao Dr. Paulo Alves envio sinceros parabéns e hipoteco a minha gratidão."


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Publicado em 19/07/2021

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