Inaugurado em 28 de novembro de 1897, o "Viaducto do Viradouro" foi a primeira grande obra de engenharia urbana da então jovem cidade de "Nictheroy". Construído na administração do Dr. Manuel Martins Torres, foi parte principal do projeto de construção da nova Estrada do Viradouro, por décadas, o principal meio de ligação entre as regiões de Pendotiba e Itaipu com o Centro histórico da cidade.

Coube à Câmara Municipal - que administrava de fato a municipalidade, na figura de seu vice-presidente, o Major João Carlos Rodarte, conduzir de perto as obras para a edificação da imponente obra de arte, grande feito da engenharia rodoviária fluminense. Em formato de 'aqueduto', o viaduto é localizado depois da subida da Garganta, começando a descida para o Largo da Batalha.

Antecedentes

A região que hoje constitui o bairro do Viradouro, por muito tempo era parte da freguesia, depois bairro de Santa Rosa, que de ocupação antiga, deve a sua denominação à antiga Fazenda Santa Rosa (séc. XVIII), que dominava vasto território e que com tempo foi sendo desmembrada.

Como final de linha, a Rua Santa Rosa se desfazia próximo à entrada da capela de Nossa Senhora do Viterbo e dava caminho às propriedades rurais que se estabeleciam em direção ao fundo do vale. Já na segunda metade do século, era de interesse desses novos moradores, a abertura de vias com o fim de valorizar suas propriedades.

Nessa época, o precário caminho que ligava Santa Rosa à região de Pendodiba passava pelo morro do Atalaia - hoje Estrada Alarico de Souza, mas a Câmara Municipal buscava uma alternativa, e a encontrou na íngreme subida pelo fundo morro do Viradouro. Esse novo caminho continha, no entanto, ainda um duro obstáculo para o trânsito dos veículos sobre rodas: o desfiladeiro da Grota do Surucucu.




Algumas alternativas foram imaginadas, mas acabou-se batendo o martelo pela construção de um Viaduto ligando o alto do Viradouro a atual região da Igrejinha.

Na sessão da Câmara municipal de 1º de agosto de 1872, resolveu-se, por proposta do Sr. Cardoso de Menezes, sustentada com dados econômicos pelo vereador Moura aprovar o traçado pela fazenda de Santa Rosa, aceitando-se a oferta de seu proprietário, o Sr. Francisco Domingues da Costa, que se propôs fazer à sua custa o primeiro trecho, da porteira de sua fazenda até o pé do morro do Viradouro.

Em dezembro do mesmo ano, o segundo trecho, do início do morro do Viradouro a Pendotiba - aí já incluindo a construção do viaduto - foi "posta em praça", termo usado na época para a abertura de licitação, sendo vencida pelo major Francisco Xavier Baptista, com um lance de 13.435$000.

A obra se arrastou por quase dois anos, pois foi só em agosto de 1874, em ato da Câmara Municipal, que foi autorizada a demarcação da estrada, e só então os herdeiros de Francisco Domingues da Costa deram início aos trabalhos do primeiro trecho.

Já em novembro, a Câmara Municipal pediu ao seu engenheiro, o Sr. Luiz Carlos Barboza, um detalhado relatório sobre o andamento da obra, o que ele apresentou em 8 de dezembro do mesmo ano (1). Os trabalhos foram então interrompidos, e em 1876 o Vereador Duque Estrada emitiu um parecer recomendando a rescisão do contrato com o major Francisco Xavier Baptista (2).

Passagem interrompida

As obras prosseguiram, a estrada foi aberta ao trânsito, mas por quase duas décadas a ligação rodoviária entre a Estrada do Viradouro e Pendotiba permanecia interrompida no trecho da Grota do Surucucu.

Em agosto de 1894, a Câmara Municipal aprovou requerimento do vereador Fróes da Cruz para liberação de verbas a fim de adquirir instrumentos de engenharia para a execução dos planos e orçamentos da ampliação da estrada para Itaipu pelo Viradouro, e não para obras de melhorias na antiga estrada do Atalaia. Em dezembro do mesmo ano foi aprovado um parecer julgando de urgente necessidade a construção da estrada, por administração da Câmara.

Após um longo de período com as obras ainda paralisadas, em setembro de 1895 o vereador João Rodarte assinalou em despacho na Câmara:

"Considerando que que a estrada do Viradouro é um importante melhoramento para o município; Considerando que essa estrada já se acha aberta em toda a sua extensão até Pendotiba, prestando bons serviços, e sendo já preferida pelos que transitam pela estrada do Atalaia; Considerando que as obras da dita estrada do Viradouro foram suspensas há cerca de oito meses e sendo danificado pelo tempo os trabalhos executados e não concluídos; proponho que a Câmara execute com urgência a conclusão d'aquela obra, mesmo por administração, pois essa demora tem prejudicado consideravelmente os trabalhos executados."

No mês seguinte, o jornal 'O Fluminense' noticiou o reinício dos trabalhos:

"É preciso, porém, não esquecer que deve ser mantido o primitivo plano adotado, nivelando-se toda a rua de Santa Rosa, a começar da esquina da do Reconhecimento (Sete de Setembro), dando-se escoamento às águas por meio de bueiros e sarjetas. É um serviço que presta a municipalidade, à Itaipu e Pendotiba e o sr. João Rodarte interessando-se como fez por aquela obra, tornou-se digno dos agradecimentos dos povos daquelas zonas."

Inauguração

Num domingo, 28 de novembro de 1897 foi enfim inaugurado o viaduto, e a própria estrada, com sólidos pilares, dando o tabuleiro passagem a dois veículos de tração animal, além dos cimentados passeios marginais para pedestres, como descreveu em editorial, 'O Fluminense' de 17 de novembro. Concluiu o texto:

"A construção desta importante via de comunicação, segundo os dados conhecidos, é de alvenaria de pedra cimento, sendo os arcos de alvenaria de tijolo e a parte externa, em geral, excetuando os arcos, de cantaria em rústico. A estrutura de todo ele é de cascalho de pedra. As guardas são constituídas por dois muros corridos de tijolo, convenientemente revestidos de cimento.

No centro do viaduto foram colocadas duas placas comemorativas; uma relembrará os nomes dos cidadãos dr. Martins Torres e João Rodarte, presidente e vice-presidente da atual municipalidade, e outra os dos cidadãos dr. Pedro Fontes e Oliveira Gomes, os executores da obra.

A estrada nova, com a boa vontade dos proprietários ali residentes, pode converter-se numa das mais lindas alamedas brasileiras. Há pontos de paisagem que são um verdadeiro encanto para vista: O Alto, a Grota, a entrada de Pendotiba, ponto de onde se descortina a Várzea de Jurujuba, o Pão de Açúcar, o Corcovado, o mar, etc., estão desafiando o pincel de Antonio Parreiras.

Notam-se pela estrada muitas construções novas. Crescente número de agricultores de pequenas lavouras vão lucrar em largo trecho cerca de 40% de economia no tempo da viagem. Está verificado que um homem viajando a pé pelo trecho do viaduto chega mais depressa a Pendotiba do que um viajante a cavalo pela estrada velha da Atalaia. Será de fácil conservação a estrada nova porque em suas margens abundam as pedreiras e há muitas amostras de Feldspato.

Estiveram presentes ao ato inaugurativo, além dos srs. Martins Torres e Rodarte, os vereadores Moura, Tibáu, Joaquim Pires, o engenheiro Fontes, dr. Geraldo Martins, capitão Manoel Benício, capitão Affonso Nunes e muitas outras pessoas cujos nomes não nos foi possível tomar."

Com a abertura nos anos 1960 da Estrada Celso Peçanha, o Viaduto, hoje parte da Estrada Gen. Castro Guimarães, perdeu sua função primordial de ligação e foi, pouco a pouco sendo cercado pela degradação social e ambiental da área. Sua imponente estrutura, que resiste bravamente ao abandono, pode ser vista por quem trafega pela via principal.



Notas

(1) "Illms. Srs. Em cumprimento ao que me foi ordenado em secção de 18 de Novembro proximo passado, examinei todos os trabalhos da 1ª sessão da estrada de Santa Roza á Itaipú, afim de, não só avaliar os trabalhos aproveitaveis dessa parte da estrada, afim de pagar se ao empreiteiro, como tambem fazer os estudos preliminares afim de dar o novo traçado á estrada.

Procurei, antes de tudo, aproveitar o trecho da estrada que está principiado no morro de D. Jacintha, por ser o menos mal feito, e aquelle onde o terreno apresentava-se em melhores condições para a preparação do leito; pretendia modificar o traçado de modo a ganhar o morro d'Atalaia, e, entroncando a estrada no alto do Viradouro, com a parte construida pelo Sr. Xavier Baptista, aproveitar ainda a parte da subida do Viradouro.

Porém o terreno não permitte este traçado; explorei ligeiramente, como podia, sem os necessarios meios para proceder á um estado mais perfeito, os terrenos naquella zona, e me parece que a estrada por ali fica em pessimas condições, pela dispozição dos morros e natureza do sólo.

O que julgo mais acertado é abandonar o morro de D. Jacintha, procurando aproveitar a parte construida no alto, na subida e na descida do Viradouro, ganhar o morro de João Clementino, á direita ou à esquerda, segundo for mais conveniente para dar melhores declives á estrada, e procurar assim ganhar a estrada.

Entretanto convém dizer que, na parte construida no Viradouro pelo Sr. Xavier Baptista, não ha um palmo de estrada que satisfaça; ainda é necessario ali um grande movimento de terras para prestar-se a estrada aos fins para que foi votada.

Pode-se entretanto muito melhorar aquelle trecho, de modo a dar commoda e facil viação; por isso, e por haver ali muito trabalho feito e que se póde aproveitar, entendo que a camara deve, sem prejuizo para seus cofres, mandar pagar ao empreiteiro até 1:500$000.

Apresentarei breve á camara a planta e o perfil longitudial da estrada e as modificações que julgo devem ser feitas no contracto que assignou o empreiteiro; então farei considerações mais longas, por conhecer melhor o assumpto, porque espero que a camara me terá concedido os meios que são precizos para trabalhar, fornecendo os instrumentos e pessoal de que careço e que já pedí á camara." - Nictheroy, 8 de Dezembro de 1874. - Luiz Carlos Barboza."



(2) Concedida a palavra ao Sr. vereador Duque-Estrada apresentou este, o seguinte parecer:

"A commissão encarregada de dar parecer sobre o requerimento em que o major Francisco Xavier Baptista, pede prorogação de prazo para conclusão das obras da lá secção da estrada de Nictheroy á Itaipú, examinando as condições do contracto, as obras e informações do Dr. Engenheiro, é de parecer que seja rescindido o contracto, não julgando estar o empreiteiro sujeito á multa, pelo que passa a expor:

É certo que o contracto estipula que o empreiteiro é obrigado a concluir as obras no prazo de oito mezes, porém, n'esse contracto não ficou definida a época em que começaria a vigorar. Como se vê das informações do Dr. Engenheiro ainda não estão marcadas todas as obras de arte e ainda são precisas fazer modificações no traçado da estrada.

N'estas condições como sujeitar o empreiteiro a multa? É preciso que a Camara corte, o mal por uma vez, isto é, que mande levantar a planta do traçado da estrada com todos os seus detalhes.

Entende, a commissão que o ter-se começado as obras sem haver planta, foi e é a origem de todos os transtornos que tem occorrido. A commissão reserva para depois, satisfeitas as diligencias abaixo, o desenvolvimento de suas idéas e propõe:

1. Que se declare desde já ao empreiteiro rescindido o contracto;

2. Que se mande com a maior urgencia medir e avaliar todos os trabalhos feitos pelo empreiteiro para lhe serem pagos, levando-se em conta as quantias já recebidas;

3. Que se mande levantar o planta da estrada, não só na parte arrematada pelo empreiteiro, como tambem da parte comprehendida entre a Cancella de Santa Rosa, até a extrema da arrematada no Viaducto do Viradouro, por que sem esta parte, a outra nenhum transito dará.

4. Que na planta que se levantar, se comprehenda o perfil longetudinal, obras de arte com todos os seus detalhes, devendo aproveitar se o mais que for possivel os trabalhos feitos, recommendando-se urgencia na apresentação da planta, bem como, o orçamento de despeza precisa com a conclusão das obras da estrada, em ambas as partes, cuja importancia não carece ser demonstrada;

5. Finalmente, verificando-se pelas allegações do empreiteiro e informações do Dr. engenheiro, profunda desintelligencia; em sentido á evitar questões e delongas, nomeie a Camara um perito engenheiro e o empreiteiro outro, que meçam e avaliem todos os trabalhos feitos. - Nictheroy, 31 de Maio de 1876 - Duque Estrada Júnior."



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Publicado em 17/08/2022

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