por Divaldo de Aguiar Lopes

Niterói dos tempos provinciais possuiu um sistema de despejo, "denominado limpeza" que em nada lhe recomendava os foros de capital da Província, e, depois do Estado, como podemos constatar pela nota que segue, divulgada pela imprensa da época:

"Pela Secretaria de polícia da Província do Rio de Janeiro se faz público que recomendou-se aos agentes de polícia a execução do § 24 do código de posturas municipais do teor seguinte: Todo e qualquer habitante desta cidade e seu termo é obrigado a mandar fazer diariamente o despejo (denominado limpeza) das imundices e águas impuras dentro do mar, nos lugares ou valas que mais remotos estiverem da povoação, cuja distância não incomode os moradores das respectivas povoações, às 11 horas nas noites de verão, e às 10 horas nas de inverno.

E o mesmo deve entender a respeito do lixo, à exceção daquele que não sendo impuro, se pode aplicar para entulhar as cavidades que houver na praia, o que pode servir de defesa aos terraços e cais construídos para defenderem as ruas e prédios da invasão do mar. A contravenção será punida com multa de 6$000 rs. na pessoa do amo, do criado, e na do senhor do escravo, sendo tudo duplicado nas reincidências."

Secretaria de polícia da província do Rio de Janeiro. 6 de Abril de 1867. Antônio Luiz Pereira da Cunha.


O Transporte dos 'Tigres'

O sistema de remoção dos barris contendo matérias fecais, a princípio sempre foi feito pelos escravos que os conduzia à cabeça, e faziam o "despejo dentro do mar". O povo chamava os barris de "Tigres"; isto porque, todos fugiam apavorados quando o condutor do fétido barril vinha se aproximando.

Quando cessou o referido sistema, "velhas e repelentes carroças" passaram a transitar pela "urbs", a recolher, semanalmente, os "Tigres" dos domicílios para o despejo no mar. Bem florescente foi nessa época a indústria de barris...

As reclamações contra o péssimo estado sanitário da cidade, não eram atendidas pelos responsáveis por tamanho desleixo, como se pode comprovar pelos ofícios enviados à Câmara Municipal de Niterói, pelo Inspetor de Higiene, Dr. Enrique Rodolfo Batista, que em 1887 assim se expressou:

"Mais de uma vez sou forçado a pedir atenção de Vv. Ss. para o sistema de remoção das matérias fecais usado nesta cidade por duas empresas, porque reputo excessivamente nocivo à saúde pública. Velhas e repelentes carroças transportam, em barris não apropriados, desde manhã à tarde, as defecções de uma grande parte da população disseminando por toda a cidade os germens de moléstias pestilenciais. É realmente original, e melhor fora não existissem essas empresas, que só servem para atestar a pouca importância que se tem dado à saúde da população desta cidade. Vv. Ss. que tanto interesse têm mostrado pelas cousas públicas não deixarão, por certo, de atender a esta minha reclamação, exigindo dessas empresas o transporte rápido de matérias fecais, em carros hermeticamente fechados, constantemente desinfetados e em horas apropriadas".

O Primeiro Projeto

Proclamada a República, é nomeado pelo Marechal Deodoro da Fonseca para presidente do Estado do Rio de Janeiro, o ilustre médico piauiense, Dr. Francisco Portella, a quem devemos a primeira tentativa, visando dotar Niterói com uma rede de esgotos, pois contratou com a Empresa de Obras Públicas no Brasil, a execução dos serviços. A Empresa divulgou em 31 de março de 1890, uma "Memória descritiva e justificativa do 10 projeto de Esgotos da Capital de Niterói", nos termos do Edital de 4 de fevereiro de 1890, onde consta os estudos necessários à execução das obras de esgotos de matérias fecais, águas servidas e pluviais da cidade de Niterói, e todos os planos que organizou e anexou ao mesmo, inclusive a tabela de taxas que a empresa propunha e que eram as seguintes:

"Para os prédios de valor locativo anual até 240$000 .... 18$000.

Para os prédios de valor locativo anual de 240$ até 700$ .... 25$0000.

Para os prédios de valor locativo anual de mais de 700$ .... 30$000.

Como garantia ofereceu a proponente, para fiel e completa execução das obras (cláusula XI do Edital), além de pessoal idôneo e do material necessário, o seguinte:

1º) Água em abundância e com a qual poderia manter nas galerias correntes fortes; pois para tanto dispunha do abastecimento d'água da cidade, que eram de inteira propriedade da empresa, nos termos do contrato de 11 de junho de 1885. Além disso, a empresa aplicaria ao serviço de esgotos obras do novo abastecimento, calculadas em quatro milhões de litros em 24 horas.

2º) Uma olaria a vapor, montada nas melhores condições, próxima à cidade e que podia dar prontos em um dia 50.000 tijolos.

3º) Todo o material de transporte necessário a um serviço rápido e em grande escala.

A olaria a que a empresa se referia, que era de sua propriedade, concorreu com os seus produtos à exposição da República Argentina e de Paris sendo em ambas premiada com medalha de ouro.

Comprometeu-se ainda, à empresa, depositar nos cofres do Estado Cr$ 20.000,00, como garantia do fiel cumprimento do contrato.

As obras paralisaram, pouco tempo depois de iniciadas, e o contrato foi transferido, então, à Companhia Cantareira e Viação Fluminense, em 2 de julho de 1893, que, não levou avante o arrojado empreendimento.

Novos Estudos

Quando ocupou a presidência do Estado o dinâmico campista Dr. Nilo Peçanha, que assumiu o governo em 31/12/1903, no ano seguinte, por decreto n.º 883, de 4 de janeiro, esse governante criou a Prefeitura Municipal de Niterói, e, nomeou para o cargo de prefeito, o ínclito engenheiro Paulo Ferreira Alves, cuja principal preocupação foi, ao encontro dos desejos do Dr. Nilo Peçanha, reiniciar os estudos para dotar Niterói de uma rede de esgotos.

O nosso primeiro prefeito contratou com o Dr. Jorge Lossio, a elaboração de um novo plano, visto o existente não poder ser mais aproveitado. O citado engenheiro apresentou novo projeto, de agrado geral, e nele adotou o sistema de "separador absoluto".

O Dr. Benedito Gonçalves Pereira Nunes, ilustre substituto do prefeito Paulo Alves, na sua Mensagem e Proposta de Orçamento, enviada à Câmara Municipal, para o exercício de 1905, assim se expressou a esse respeito:

"Há uma série de circunstâncias gerais e locais, cuja solução torna difícil das funções administrativas nesta cidade; e para vencê-las carece o poder público de muita tenacidade, muita paciência e muito critério. Se, na contingência que nos achamos, em face das responsabilidades da investidura honrosa, nos cumpre o dever de vos expor um programa administrativo, a que somos infensos, porque em geral constituem uma série de promessas irrealizáveis, ou uma simples enumeração das necessidades e lacunas do serviço público, sem proveito para a consumação dos benefícios de que se acresce, sentir-nos-íamos a gosto, declarando aqui que a realização dos esgotos da cidade de Niterói constitui tão meritória obra, tão preciosa medida do saneamento, que deveríamos fazer desses utilíssimos serviços, a preocupação absorvente do governo local.

Já o meu ilustre antecessor, o Sr. Dr. Paulo Alves, que é um engenheiro provecto, havia tomado como ponto de partida dos vastos melhoramentos projetados para esta cidade a construção de uma rede de esgotos. E, nesse intuito, deixou organizada a comissão de levantamento de uma planta topográfica rigorosa sobre a qual devem ser projetados a canalização e todos os melhoramentos da cidade.

Esse trabalho, próximo de terminar, continua confiado a um profissional competentíssimo, auxiliado por uma comissão de engenheiros. Parece-nos que um dos motivos que intimidavam as administrações passadas, para realização desse cometimento, era o receio do grande ônus que o serviço poderia acarretar ao erário municipal, forçando os proprietários a fortes contribuições, que embaraçariam talvez o desenvolvimento da cidade".





Tentativas e Críticas

A Prefeitura Municipal de Niterói, em 1905, resolveu abrir concorrência pública para execução da rede de esgotos, mas não tendo êxito essa iniciativa, o Governo do Estado resolveu, então, contratar a execução dos referidos serviços com a Companhia Cantareira Viação Fluminense, ex-vi da Lei n.° 750, de 20 de outubro de 1906.

O contrato só foi aprovado pela Assembleia Legislativa, em 26 de setembro de 1908, depois de várias modificações nas suas cláusulas, o que motivou sérias divergências entre as partes interessadas, e assim não passou, porém, de mais uma fracassada tentativa, visto ter sido rescindido o contrato pela Deliberação de 24 de julho de 1911.

Do jornal "Niterói", que se editava nesta cidade, extraímos, da sua edição do dia 5 de junho de 1911, a seguinte crítica:

"Esgotos - Agora que o Conselho Municipal parece disposto a trabalhar por este pobre município, ocorre-nos lembrar que os Srs. vereadores podiam tomar uma providência, no sentido de ser esta cidade dotada deste indispensável melhoramento. É uma vergonha que Niterói ainda não possua esgotos, coisa que outras cidades do interior do Estado já possuem, e que, entretanto, não dispõem de recursos iguais aos que nós temos.

Os Srs. edis niteroienses podem ficar certos que esta população preferia não ver as ruas de Niterói iluminadas à luz elétrica, não ter parques arborisados, alamedas catitas ou ruas calçadas a paralelepípedos, contanto que tivesse um serviço de esgotos perfeitamente organizado.

O espetáculo que diariamente se apresenta aos nossos olhos é deveras degradante e enche-nos de vergonha. O contraste da luz elétrica e outros ruidosos melhoramentos, com os apavorantes "Tigres" é edificante!...

Sabemos que existe um contrato firmado entre o governo do Estado e a Companhia Cantareira Viação Fluminense para a realização desta eterna aspiração dos habitantes de Niterói, mas esta Companhia parece não estar muito disposta a levar a efeito esta grande obra de saneamento. Ela, o que queria, era impedir que outros fizessem. A Companhia não come nem deixa que os outros comam.

O negócio de esgotos não era, talvez, muito vantajoso, e a Cantareira só gosta de se meter em bons negócios. O Conselho Municipal, entretanto, poderia agir eficazmente neste sentido, representando junto ao governo do Estado, em nome da população niteroiense, contra o procedimento pouco regular desta empresa, que se abstém de levar a efeito uma obra de tão grande alcance que beneficiaria muito a esta cidade, sob todos os pontos de vista.

Se a Cantareira não pode nos dar o tão almejado esgoto, que faça a rescisão do contrato (se é que ele ainda não caiu em caducidade), contratando-se novamente com quem esteja disposto a fazê-lo imediatamente, ou fazendo a própria Prefeitura, nos limites dos seus recursos orçamentários, embora tenham de ser adiados outros empreendimentos.

Por nossa vez, muito desejaríamos ver este melhoramento introduzido em Niterói, parecendo-nos que isso não é coisa tão difícil de ser realizada, visto que em outros municípios de muito menos recursos já existem redes de esgoto. Um pouco de boa vontade dos Srs. Membros do Conselho Municipal, e Niterói deixará de ser retrograda e caminhará triunfalmente na estrada radiante do progresso".


Início do Serviço de Esgoto

Foi na profícua administração do Prefeito Dr. Feliciano Pires de Abreu Sodré Junior, que se iniciaram os serviços da rede de esgotos da cidade, obra máxima do saneamento da capital do Estado, que os niteroienses reclamavam há dezenas de anos.

Sodré, na Mensagem que apresentou à Câmara Municipal de Niterói, em novembro de 1911, declarou, sobre a encampação do Serviço de Águas (Lei n.º 984, de 16-11-1911), e sobre o empréstimo necessário para as obras do saneamento da cidade, o que segue:

"Impedida a administração, de um lado, por deficiência orçamentária, de realizar o programa de melhoramentos impostos pelas exigências civilizadoras do progresso, sob o influxo impetuoso da capital da União, e de outro, pela falta de serviços perfeitos de abastecimento de água e de esgotos, sistemas arterial e venoso de uma cidade, sem os quais a vida intensa e febril dos grandes centros se torna impossível, escabrosa tem sido a estrada seguida até este momento.

Felizmente o ilustre Sr. Presidente do Estado, pesando bem os sérios embaraços opostos ao desenvolvimento natural e rápido da capital fluminense, entendeu de constituir uma das partes do seu fulgurante programa de governo, o saneamento e remodelamento de Niterói. E, sem sacrifício para o Estado, pode ser saneada a sua capital.

Entregues ao município os serviços de abastecimento de água e de esgotos, consoante os princípios correntes de boa administração local, realizado um empréstimo sob a responsabilidade do Estado, em condições que a municipalidade não poderia obter pelo jogo do seu crédito isoladamente nos grandes centros do capitalismo internacional, estará resolvida a parte fundamental do saneamento desta cidade.

Resolvida a questão por este modo, seria feito o resgate dos títulos dos empréstimos de 1907 e 1910, reduzindo-se a taxa de juros de 7% a uma outra muito inferior, compatível com o crédito do Estado, nos mercados prestamistas.

E assim, encampando o serviço de abastecimento de água, rescindindo, como o fez o contrato para o serviço de esgotos e prestando, finalmente, a responsabilidade do Estado ao empréstimo destinado ao seu saneamento, terá o Sr. Dr. Oliveira Botelho prestado à Niterói o concurso valioso do seu patriotismo, o poder da sua energia, o brilho intenso do seu talento, dentro da sã doutrina da municipalização dos serviços orgânicos da cidade, que não podem e não devem constituir fonte de exploração industrial".


A Revisão do Projeto de Esgotos

Em novembro de 1912, o Prefeito Dr. Feliciano Pires de Abreu Sodré Junior, na sua Exposição dos Serviços Municipais, apresentada à Câmara Municipal de Niterói, informava que:

"Na revisão do projeto de esgotos, que havia sido organizado pelo ilustre Dr. Jorge Lossio, foram mantidas as principais características técnicas do projeto a rever. A cidade ficou dividida em três distritos de coleta e tratamento das águas a receber na rede de esgotos, águas essas que, tratando-se do sistema separador absoluto, compreendem apenas as águas fecais, as servidas de uso doméstico e as fabris. Esses distritos cuja delimitação é traçada segundo os principais divisores de águas são: 1º) Distrito Norte, limitado pelo divisor d'água da rua de Santana, compreendendo os bairros de Engenhoca, Maruí e Barreto. 2º) Distrito Central, que abrange metade de São Domingos, toda a parte central da cidade, todo o Fonseca e vai até a rua Carlos Gomes. 3º) Distrito Sul, que abrange Santa Rosa e Icaraí e a outra metade de São Domingos.

Sem sacrifício de condições técnicas, o projeto realizará a condução das águas a coletar até a instalação de tratamento de cada distrito, com um número relativamente pequeno de estações elevatórias. É assim que o distrito Sul tem apenas quatro elevações em marcha, o Central duas e o distrito do Norte quatro. As águas dos esgotos serão tratadas antes de lançadas na baía e esse lançamento só será feito nas horas de vazante, pela interposição de uma caixa de acumulação.

A escolha do processo de tratamento será objeto de estudos experimentais, tornados necessários pelo de dados completos a respeito e e pelo cuidado particular exigido pela defesa das praias. É bem de ver que as conclusões atingidas nesses trabalhos serão úteis não só à cidade de Niterói mas a todo o Estado e a toda a República".


Início dos Serviços

O "Diário Fluminense", que se editava nesta cidade, divulgou na sua edição do dia 1º de janeiro de 1913, a seguinte nota:

Saneamento de Niterói, Início do Serviço de Esgotos

A Prefeitura Municipal de Niterói iniciou ontem o serviço de esgotos deste município, que servirá de base a execução das obras de seu saneamento e remodelamento, um dos pontos capitais do programa do atual governo fluminense. O serviço começou no distrito Central, devendo inaugurar-se, por estes quatro dias, os dos distritos Norte e Sul.

Achando-se ausente em Rezende o Sr. Dr. Oliveira Botelho, Presidente do Estado, o Dr. Feliciano Sodré Junior, Prefeito de Niterói, dirigiu a S. Excia. um telegrama de felicitações, não só pelo 2º aniversário do seu governo, que passou justamente ontem, como pelo início do grande melhoramento, que é uma das maiores preocupações administrativas".


A Paralização dos Serviços

O Dr. Feliciano Sodré foi substituído na Prefeitura pelo engenheiro militar Rodolfo Villanova Machado, em cuja operosa e curta administração (de março a dezembro de 1914), os serviços da rede de esgotos prosseguiram normalmente sendo durante esse período administrativo, inaugurado o distrito Norte da rede de esgotos da cidade.

Na administração do Prefeito Dr. Manoel Otávio de Souza Carneiro, prosseguiram os trabalhos e foram concluídos alguns coletores e a elevatória central, possibilitando, assim, entrar em funcionamento, mais uma parte da rede de esgotos já construída.

Na Mensagem apresentada à Câmara Municipal de Niterói, em 10 de novembro de 1915. o Prefeito Otávio Carneiro, declarou:

"Os serviços da rede de esgotos sanitários, em via de realização têm sido progressivamente realizados e deles já está servida a parte central da cidade. Pela própria natureza do serviço de esgotos, que permite utilizar cada trecho logo que concluído, essas obras poderiam progredir até o termo, sem necessitar de recursos extraordinários.

É necessário, porém, considerar que o desenvolvimento desse serviço exigirá acréscimo notável no consumo d’água, e que o abastecimento atual não encerra as sobras necessárias para esse acréscimo. Por esse motivo não poderei continuar a construção da rede de esgotos, enquanto não esteja seguro de poder realizar o reforço de abastecimento d'água".


A Taxação dos Serviços de Esgotos

Ao Prefeito Manoel Otávio de Souza Carneiro, deve-se as primeiras sugestões sobre o sistema de taxação para o serviço de esgotos de Niterói, a julgar pelas declarações exaradas na sua Mensagem de 10 de novembro de 1915, onde se lê:

"As tabelas e impostos são como já vos disse -, as mesmas atualmente vigentes. Entretanto, para o serviço de esgotos, - não havendo ainda tabela, - é preciso estudar as taxas a fixar. Os encargos pesadíssimos do empréstimo de 1912, funda-se especialmente sobre o imposto predial, e as taxas d'água e de esgotos.

Dessas fontes hão de provir os recursos necessários para honrarem enormes compromissos de que a cidade foi irrefletidamente onerada. E tendo consentido em tomar a desmedida e imprudente responsabilidade desses compromissos, cumpre-nos agora sabermos nos resignar aos sacrifícios que são indispensáveis para poder honrá-los.

A tabela de serviço de esgotos, tendo de ser fixada, portanto, em face da necessidade de alcançar uma certa renda, não poderá ser uma tabela moderada. Antes de estudar-lhe os valores, cumpre fixar preliminarmente o tipo a que ela se filiará. Usualmente, a taxação do serviço de esgotos é organizada sob um dos três padrões seguintes:

a) taxa proporcional ao valor locativo;

b) taxas fixas progressivas com valores locativos;

c) taxas fixas correspondentes ao número de aparelhos sanitários esgotados.

Em qualquer dos tipos é necessário estabelecer taxas especiais para as fábricas e para outros serviços, o que torna a organização da tabela uma questão extremamente complicada.

A minha opinião pessoal é o que o mais prático e mais equitativo de todos os sistemas de taxação, seria o que se baseasse sobre a arrecadação conjunta das taxas d'água e de esgotos", etc..


A Deliberação n.º 284, de 31 de dezembro de 1915 (Orçamento Municipal, estabeleceu no seu art. 87, que os serviços d'água e esgotos eram obrigatórios para todos prédios locais dentro da zona limitada pelo art. 85, da supra citada deliberação, e onde qualquer daqueles serviços estivesse em funcionamento efetivo e as taxas respectivas seriam devidas ainda que não tivesse sido feita a ligação desses prédios à canalização pública.

Aviso aos Assinantes...

O sistema de remoção semanal das matérias fecais dos prédios que não possuíam "sumidouros" nos quintais e zonas em que não existiam redes de esgotos, continuou a ser feito pelas carroças da "Empresa de Remoção de Matérias Fecais de Niterói", que transportava os "barris", alcunhados pelo povo de "Tigres", para serem despejados no mar na "Ponta da Armação".

Periodicamente, a empresa que explorava o dito serviço, inseria nas páginas do "O Comércio", que se editava nesta cidade, avisos aos seus assinantes em atraso, como se pode constatar pela seguinte:

"Declaração", publicada no citado jornal do dia 26 de novembro de 1915: "Empresa de Remoção de Matérias Fecais. Prevenimos aos senhores assinantes em atraso e para a boa ordem do serviço desta empresa que deverão quitar seus débitos mensalmente até o dia 15 e os que assim não procederem não terão direito à reclamação. Outrossim, do dia 1º do mês próximo ficam suspensos todos os serviços feitos por favor. Niterói, 22 de novembro de 1915. A. F. de Oliveira & Cia".

A Conclusão da Rede de Esgotos

O Prefeito Dr. Enéas Ribeiro de Castro, na Mensagem que enviou à Câmara Municipal de Niterói, em 5 de dezembro de 1920, declarou, à respeito da conclusão da rede pública de esgotos, o seguinte:

"O dia 10 de julho próximo passado será sempre para Niterói uma data memorável, porque marca na sua história a realização da mais ardente de suas aspirações, do seu problema máximo, a cuja solução estava indissoluvelmente ligado o futuro do Município. Refiro-me à rede pública de esgotos. Inaugurou-a, naquela data, o Exmo. Sr. Dr. Raul Veiga, honrado Presidente do Estado, tendo o ato se revestido, já com a presença das altas autoridades do Estado e do Município, já com o comparecimento de representantes de todas as classes sociais e de grande multidão.

Já tivemos conhecimento dos passos dados do levantamento do necessário e, pois, assim, do início e andamento das obras.

Venho comunicar-vos agora a terminação deste importante melhoramento, que abrirá para Niterói uma nova era de prosperidade com as grandes vantagens que sua realização vem trazer ao Município. Os poucos trabalhos que faltavam terminar quando da inauguração, acham-se já totalmente concluídos, estando a cidade inteiramente esgotada.

A rede atual compreende 81.733 metros de galerias, 690 poços de visita, 217 fluxíveis e 16 elevatórias".


As Solenidades de Inauguração

A inauguração da Rede de Esgotos Sanitários de Niterói, realizou-se no dia 1º de julho de 1920. Às 8h30 começaram a chegar à Praça Martim Afonso os convidados especiais, dentre eles destacavam-se o Dr. Carlos Chagas, Diretor da Saúde Pública do Distrito Federal, e os representantes do Clube de Engenharia, Drs. Arruda Beltrão e Emidio Pereira, além de grande número de jornalistas cariocas.

Às 9 horas, um cortejo de mais de trinta automóveis, rumou para o bairro de Icaraí, onde foi inaugurada a elevatória da rua Lopes Trovão (antiga do Fundador). Discursou durante o ato inaugural o Prefeito Dr. Enéas Ribeiro de Castro, que ressaltou a importância do novo melhoramento citadino.

Depois das solenidades, realizou-se um elegante 'Garden Party', no Parque da Vicência; automóveis e bondes especiais conduziram os convidados e outras pessoas gradas até o local.

O parque achava-se caprichosamente ornamentado, e em oitenta mezinhas de madeira, de estilo rústico e simetricamente dispostas, foi servido o "lunch" e bebidas finas.

E, assim, transcorreram as festividades de inauguração desse importante índice de progresso, podendo os niteroienses, a partir de então, se orgulhar dos foros de capital que sua cidade ostentava.

Diferentes concessionários

O serviço de esgotos de Niterói, cuja rede pública fora construída e inaugurada pela Prefeitura, por partes, desde 1914 até 1º de julho de 1920, época em que ficou concluído o esgotamento total da cidade, passou, em 1942, juntamente com o serviço de águas, para a firma Dahne, Conceição & Companhia, vencedora da concorrência pública, aberta por interferência do Estado do Rio de Janeiro, para a concessão e exploração dos referidos serviços.

A competente escritura pública foi lavrada no dia 13 de setembro de 1941, no Sexto Tabelião de Notas Públicas e Judicial, ficando a empresa concessionária obrigada a explorar os serviços de águas e esgotos da cidade e ampliar a rede existente.

Pela cláusula sexta do contrato estipulou-se que, "a zona de concessão" abrangeria o Município de Niterói, sendo que, em relação ao serviço de esgotos, observar-se-ia o disposto na cláusula vigésima do contrato, pela qual a concessionária obrigava-se a executar a remodelação e extensão da rede de esgotos da cidade e as instalações correspondentes, de acordo com o projeto então existente e aprovado pela Prefeitura; projeto esse que se estendeu, também, uma parte do Município de São Gonçalo, isto é, a entre o Rio Bomba e a Covanca.

Outrossim, obrigava-se, ainda, a dar desenvolvimento à nova rede de esgotos ou seja "atender às necessidades da cidade dentro do perímetro urbano, manter a rede e as instalações correspondentes em perfeito estado de conservação"; introduzir nos serviços, mediante aprovação prévia da Prefeitura, os melhoramentos que se tornassem "necessários ao perfeito funcionamento, de modo a garantir as boas condições de higiene da cidade, dependentes desses serviços".

Criada a "Companhia Brasileira de Águas e Esgotos de Niterói S.A." (CBAEN), que fazia parte do grupo das diversas empresas controladas pela firma Dahne, Conceição & Companhia, passaram, então, os referidos serviços a serem executados pela mesma, a partir de janeiro de 1942.

A Incorporação da CBAEN ao Patrimônio Nacional

A firma concessionária Dahne, Conceição & Companhia, por ter-se declarado expressamente impossibilitada por via de dificuldades financeiras, de continuar, juntamente com as diversas empresas dela subsidiárias, a executar os empreendimentos a que se propusera, foi, então, incorporada, em caráter transitório, ao Patrimônio Nacional (Decreto-Lei n.º 6.156, de 2/5/1944); sendo, em seguida, nomeado um liquidante investido de todos os poderes de administração e liquidação dos bens da empresa.

Por força do Decreto-Lei n. 8.766, de 21 de janeiro de 1946, passou a CBAEN a ser administrada, em caráter provisório, pelo Estado do Rio de Janeiro, sendo, então, concedido novo empréstimo à Companhia mediante garantia do Tesouro Nacional. Em 1946, o Decreto n.º 9.680, de 30 de agosto, revalidou o Art. 1º do Decreto-Lei n. 6.456, de 2/5/1944, na parte referente à CBAEN, mantendo-se, assim, a sua incorporação ao Patrimônio Nacional.

A partir daquela época, a empresa passou a ser administrada por uma diretoria de três membros diretamente subornados ao Ministro da Fazenda, sendo o diretor-presidente indicado pela Caixa Econômica Federal do Estado do Rio de Janeiro e dois diretores, respectivamente, indicados pela Caixa Econômica do Rio Grande do Sul e pela Caixa Econômica Federal do Rio de Janeiro, até que o governo deliberasse, definitivamente, sobre a dificultosa situação financeira da empresa (Art. 3.0, Dec. cit.).

A Estação Depuradora

Niterói possui uma modelar "Estação Depuradora", construída e inaugurada em 1948, na rua Lemos Cunha, no bairro de Icaraí. O efluente recebido pela citada estação, proveniente da coleta das águas fecais dos bairros de Icaraí e Santa Rosa, vai para um "Poço-Visitável" onde existe uma grade que retém as matérias sólidas, tais como trapos, paus, etc., dai passando para a "Usina Elevatória" que compensa as variações de descarga entre a rede e as bombas; em seguida o efluente é levado para as "Caixas de Areia", onde, através de um "movimento de chicana vertical", isto é, subindo e descendo em zig zag, é decantada a areia carreada pela canalização da rede de esgotos.

As "Caixas de Areia Verticais" escoam-se por uma calha que conduz o efluente ao "Digestor-Primário", onde permanece o tempo necessário para tratamento biológico das matérias fecais, aí se realizando a fase anaeróbica e acumulando-se, então, na cúpula do "Digestor" o "Gás de Esgotos", que se desprende durante a fermentação da matéria fecal; gás este que contém cerca de 70% de metano.

Do "Digestor-Primário" a parte líquida, tratada e decantada, é conduzida, por outra calha, aos aero filtros, realizando-se, então, a fase aeróbica do tratamento biológico.

Após esses filtros, existem, ainda, os "Digestores Secundários", que completam a decantação, e, assim, as águas depuradas e devidamente filtradas são lançadas no rio Icaraí que possui sua foz no "Canto do Rio", no final da Praia de Icaraí.

Adubo

A lama decantada no "Digestor-Primário" é levada aos "Leitos de Secagem", constituídos de camadas de areia e de uma série de drenos que extraem a água contida na referida lama, que, após evaporação natural, se transforma em excelente adubo agrícola, completamente inodoro.

O Gás de Esgotos

O "Gás de Esgotos" produzido pelas fermentações das matérias fecais, por ser inflamável, passa por um "fecho-hidráulico", cuja finalidade é impedir, em caso de combustão acidental, que esta se transmita aos “Digestores", pois, se tal fato ocorresse, provocaria violenta e desastrosa explosão.

O poder calorífico do citado gás é utilizado, apenas, no aquecimento da serpentina do "Digestor-Especial" onde, através da variação da temperatura, se realizam as condições ideias de fermentações, obtendo-se, então, amostras de fermentos com as quais se ativam, mediante controle de laboratório, as reações biológicas do "Digestor-Primário".

O "Digestor-Especial", também chamado "Digestor-em-Separado", difere dos demais porque possui cúpula metálica com mobilidade e dispositivos semelhantes aos dos gasômetros comuns.

As experiências para utilização do "Gás de Esgotos", em larga escala, devem ser controladas por um laboratório especializado, cujas instalações existem na "Estação-Depuradora", faltando, apenas, pessoal habilitado e material necessário para funcionar.

Grande volume do gás é solto no ar, isto porque a "Depuradora" não dispõe de motores movimentados a "gás-pobre" para utilizá-lo, em lugar da eletricidade que seria, assim, reservada para os casos de emergência.

A Volta dos Serviços de Águas e Esgotos para a prefeitura

O decreto n.º 30.836, de 12 de maio de 1952, desincorporou do Patrimônio Nacional os bens da "Companhia Brasileira de Águas e Esgotos de Niterói", de que trata a escritura lavrada em Notas do Tabelião do 13º Ofício, visto ter o governo do Estado do Rio de Janeiro se responsabilizado pelos créditos que a supracitada empresa possuía nas Caixas Econômicas Federais do Rio de Janeiro e dos Estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

A Prefeitura Municipal de Niterói ficou sub rogada nos direitos e obrigações da Companhia, sem qualquer responsabilidade ou obrigação com o governo da União, voltando, assim, os referidos serviços ao poder concedente originário.

O Convênio entre a PMN e o Estado

A entrega dos serviços de águas e esgotos à Prefeitura Municipal de Niterói foi, na verdade, simbólica, isto porque, ato contínuo, passou para o Estado, mediante convênio celebrado, por força do Decreto 4.168, de 23 de maio de 1952, com as Prefeituras de Niterói e de São Gonçalo. A partir de 17 de julho do citado ano, começaram aqueles serviços a funcionar sob a responsabilidade da "Superintendência de Aguas e Esgotos de Niterói" (SAEN).

O Estado obrigou-se, de acordo com a cláusula quinta do convênio firmado, a explorar os serviços de águas e esgotos e nele exercer a mais ampla administração, com plena posse de todas as instalações; fixar tarifas relativas à prestação dos serviços de águas e esgotos sanitários e fazer a regulamentação técnico administrativa dos serviços e tudo mais que indicado seja para o seu bom desenvolvimento.


Publicado originalmente na Revista 'Guanabara Fluminense', em março de 1954. Na imagem de Capa, o Presidente do Estado Raul Veiga inaugurando uma elevatória na rua Dr. Paulo César (Revista Fon-Fon, julho de 1920).


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Publicado em 24/05/2023

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