Cap. 24 - 'Niterói em Três Tempos', por Heitor Gurgel

Todo o primeiro semestre desse ano foi dedicado às eleições presidenciais, como Brasil voltado para elas quando, em junho, começaram a surgir boatos alarmistas. Não haveria mais eleições. Vargas não queria entregar o poder. Havia sido descoberto um terrível plano comunista para o País. E entre boatos chegou o mês de outubro, quando a coisa principiou a ferver. O dia 10 de novembro amanheceu como todos os demais dias, pelo menos para os brasileiros que não estavam acostumados a ouvir rádio pela manhãzinha ou ler os jornais nas primeiras horas do dia.

Mas, foi pelo rádio que a notícia chegou ao povo. Desde a véspera, o Brasil tinha uma nova Constituição. Haviam sido fechados os poderes legislativos federal, estadual e municipal. Para o Estado do Rio o acontecimento tinha outro particular aspecto, com a exoneração do Almirante Protogenes Guimarães, muito doente e praticamente afastado do Governo ativo e a nomeação de um Interventor Federal, cuja escolha recaiu em outro Oficial da Marinha.

A Doença do Almirante

Desde janeiro de 1937 que o Estado do Rio vivia num clima de insegurança política, com a grave doença de seu Governador. Meses depois de investido, o Almirante Protogenes Guimarães viajou, licenciado, para Europa a fim de fazer uma operação da qual infelizmente não tirou grandes e esperados resultados. Depois, foi preciso conceder ao Governador doente nova licença, durante grande parte da qual esteve internado numa Casa de Saúde, no Rio de Janeiro. Havia, pois, um enorme vazio na administração do Estado, embora, no Ingá, estivesse interinamente um conhecido e estimado político, Heitor Collet, que muito se esforçou para preencher esse vácuo na administração pública.

O Integralismo

No quadro político nacional, as ameaças dos integralistas naqueles últimos meses de 1937, intensificadas depois da célebre "noite dos tambores silenciosos", traziam o povo brasileiro apreensivo. O "slogan" - Quem não é integralista é comunista - levou para o quartel general da Rua Sachet muitas centenas de brasileiros que assim pensavam salvar o Brasil de Moscou. Certos sacerdotes protegiam abertamente o integralismo e muitos católicos, olhos voltados para o lema "Deus, Pátria e Família", ideologicamente perfeito, aumentaram a caudal verde.

O próprio Governo Federal parecia apoiá-lo; Polícia Federal protegia-o e o Presidente da República chegou certa vez a assistir das sacadas do Palácio do Catete, a uma parada monstro dos seguidores de Plínio Salgado. Enquanto isso, os políticos democratas se aprestavam para as eleições em torno de dois candidatos, Armando Sales de Oliveira e José Américo de Almeida. No Estado do Rio, apenas refeito das terríveis lutas políticas de 1935, nenhuma dessas candidaturas parecia reunir as preferências dos eleitores. E o dia 9 de novembro terminou sem novidades no político-eleitoral. Nesse mesmo mês de novembro. Niterói assistiu a vitória de uma tenaz campanha contra um ilustre Oficial da Marinha, o Comandante Miguelote Viana, afinal afastado da Prefeitura niteroiense e substituído pelo advogado Alfredo Bahiense.

Morte, dor e luto

Niterói, que se cobrira de luto quando da morte do poeta fluminense Alberto de Oliveira, ocorrida em junho desse ano, voltava a entristecer-se mais ainda com o falecimento do grande pintor brasileiro Antonio Parreiras, em outubro seguinte desse mesmo triste ano. Antonio Parreiras, laureado artista do pincel, de renome mundial, nasceu em São Domingos e era primo do Comandante Ary Parreiras, um dos vultos da História do Estado do Rio, que esta à espera de quem lhe trace o caráter firme e a conduta ímpar no cenário da política nacional.

O Estado Novo

O Estado Novo, instituído a 10 de novembro de 1937, marcou uma época na História do Brasil. Descontando-se seus inúmeros erros e injustiças, o saldo deixado em 8 anos de vigência (1937-1945) foi compensador para o País e para o povo. Para exemplificar esse saldo favorável, basta ver-se a que se passou depois de 10 de novembro de 1937, na Prefeitura de Niterói. Daí para a frente, houve como que uma nova era, que marcou nova método de Governo, pondo acima dos interesses pessoais os da coletividade. Os próprios vereadores de após 1937 vieram com outra mentalidade, com um desejo mais forte e sadio de fazer algo de bom para a cidade e para seu povo. Não que antes do Estado Novo não tivesse havido dignos edis e operosos e progressistas prefeitos, mas o próprio conceito de governar tomou outra orientação e sentido.

Um Moço no Ingá

No dia 10 de novembro de 1937, tomava posse do Governo do Estado o Comandante Ernani do Amaral Peixoto. À solenidade compareceram funcionários estaduais cujos pagamentos estavam em grande atraso, fornecedores habituais do Estado, amigos e companheiros do empossado, além de políticos seguidores do jornalista J. E. de Macedo Soares. O jovem oficial da Marinha, que depois se revelou operoso administrador, foi recebido com geral desconfiança dos meios ligados ao Estado do Rio, por sua juventude e inexperiência.


Publicado originalmente no jornal O Fluminense em 25 de novembro de 1973

Na imagem de capa, Getúlio Vargas


Série Niterói em três tempos








Publicado em 28/03/2023

Despacho de Dom João VI Leia mais ...
Carta de Lei Nº 6 de 1835 Leia mais ...
Carta de Lei Nº 2 de 1835 Leia mais ...
Pronunciamento da Mesa do Desembargador do Paço Leia mais ...
Representação do Ouvidor da Comarca Leia mais ...
Escritura de Renúncia de Terras Leia mais ...
Auto da Posse da Sesmaria em 1573 Leia mais ...
Alvará de Criação da Vila em 1819 Leia mais ...
Símbolos de Niterói Leia mais ...