Cap. 28 - 'Niterói em Três Tempos', por Heitor Gurgel
Coube a abril dar a nota sensacionalista do ano, em Niterói. O desastre com o noturno de Campos. Era uma quarta-feira de Trevas. A Igreja comemorava a Semana Santa, como de hábito, como de hábito o noturno campista deixara a estação da Leopoldina, em Niterói, com alguns minutos atrasados. E a viagem foi indo, indo, quando de repente ao se aproximar o comboio da Estação de Itaboraí, na garganta de um desfiladeiro, deu-se o descarrilhamento, projetando a locomotiva e a maior parte dos vagões no Rio dos Índios. Dos 24 vagões, da composição, apenas os oito últimos ficaram tombados na linha. 56 mortos e 61 feridos foi o dramático saldo do desastre que emocionou Niterói, cujo Hospital Antônio Pedro socorreu grande parte das vítimas.
E julho chegava trazendo amaríssima decepção para os brasileiros. No dia 16, o famoso time brasileiro de futebol disputando no Maracanã o Campeonato Mundial, depois de ganhar de vários adversários, no jogo final, com o Uruguai foi por este derrotado. O Brasil inteiro chorou e lamentou a derrota.
Julho findou com a notícia do rompimento definitivo do governador Macedo Soares com o PSD e o PTB ficando somente com a UDN.
Em agosto, uma nova entristecia o Brasil e especialmente o Estado do Rio e a sua capital. Falecera no Rio de Janeiro, o sábio Vital Brazil, benemérito fundador do Instituto que tinha o seu nome, em Niterói.
5 de dezembro de 1950. Os brasileiros foram às urnas para eleger o Presidente da República e vários governadores. No Estado do Rio, dois candidatos disputavam o Ingá: o Comandante Ernâni do Amaral Peixoto e o advogado José Eduardo do Prado Kelly, da UDN e apoiado pelo Governador Macedo Soares e vista com bons olhos por várias autoridades federais. Mais de 180.000 votos separaram o vencedor Amaral Peixoto, de seu ilustre oponente, Prado Kelly. No campo federal, Getúlio Vargas derrotava os demais candidatos.
Um dos últimos atos do Governador Macedo Soares foi inaugurar o Hospital Antônio Pedro, no dia 6 de janeiro de 1951, cuja construção estava quase concluída quando ele assumiu o governo de 1947. Coube ao Governador Macedo Soares comprar todo o aparelhamento e isso ele fez sem olhar a gastos, dotando o hospital do que havia de melhor.
A volta de Vargas e do Comandante
Estava escrito que Getúlio Vargas voltaria ao poder pelos braços do povo. Como escrito estava que o Comandante Ernâni do Amaral Peixoto retornaria ao Ingá pelo voto popular. E os retratos de Vargas voltaram às paredes de repartições e casas comerciais. Em Niterói, no prédio contiguo ao Palácio Nilo Peçanha, que então ainda se chamava Palácio do Ingá, ocupado pelo Serviço Estadual de Imprensa e Propaganda, foi um servente de repartição quem pôs "o retrato do Velho no mesmo lugar", como dizia o povo cantando. O servente logo que a apuração demonstrou que Vargas seria a vitorioso, foi ao porão, pegou a fotografia limpou-a e colocou-a no gabinete do diretor. Acontece, porém, que esse ilustre funcionário era antigetulista, mas como fosse bastante inteligente e não acreditasse em "levitação espontânea", pensou duas vezes e fez de conta que não via o "retrato do velho no mesmo lugar".
Apesar, contudo, das esperançosas promessas feitas por Vargas e a confiança que o povo brasileiro nele depositava, os prometidos dias felizes, de fartura e de contenção de preços, não chegavam nunca; pelo contrário, o custo de vida a partir de 1951 subia cada dia mais e mais. E foi então que o Zé Povinho ouviu falar pela primeira vez numa tal de "espiral inflacionária", culpada de tudo...
Em Niterói, o Comandante nomeava para a Prefeitura de Niterói, o engenheiro Daniel Paes de Almeida que aos poucos foi se assenhoreando dos problemas municipais. Foi em 1952 que o niteroiense começou a ver que o prefeito Paes de Almeida estava trabalhando, com o início da retificação e asfaltamento da importante avenida Estácio de Sá. Meses depois, os moradores do Canto do Rio e adjacências ouviram, numa manhã de março de 1953, um enorme estrondo que sacudiu várias casas. Assustados pensaram logo na Ponta da Armação e na Ilha do Caju. Nada disso, felizmente.
Era a primeira carga de dinamite, um pouquinho forte demais, para a abertura de um túnel sob o Morro do Cavalão que ligaria Icaraí (Rua Lemos Cunha) ao Saco de São Francisco, encurtando a distância que separava os dois bairros. As obras do túnel, contudo, só tiveram incremento, após a saída do Prefeito Paes de Almeida durante o governo Roberto Silveira. O túnel foi inaugurado na administração Celso Peçanha cujo prefeito terminou os acessos às duas bocas do túnel, em Icaraí e no Saco de São Francisco.
1954 Trágico
O segundo semestre de 1954 foi de festas para Niterói, com as inaugurações de modernos Grupos Escolares em Pendotiba e na Engenhoca, do ginásio coberto do Caio Martins para jogos de vôlei e basquete e dos edifícios do Diário Oficial e das Secretarias. Mas, em agosto, acontecia o imprevisto, o suicídio de Getúlio Vargas. E o ano trágico acabou com o brasileiro triste ainda. No Catete Presidente Café Filho envidava esforços para conter a inflação e alguns políticos.
E principiou 1955 com os niteroienses, que costumavam viajar para o interior do Estado, dispondo de uma moderna e espaçosa Estação Rodoviária, último melhoramento deixado em Niterói pelo Governador Amaral Peixoto ao término de seu governo.
Ano novo, nova vida
31 de janeiro de 1955, tomavam posse ao mesmo tempo, o Governador Miguel Couto Filho, eleito pelo PSD-PTB, seu vice, Roberto Silveira e o Prefeito de Niterói, Professor Alberto Fortes. Dias depois, a 5 de fevereiro, D. Carlos Coelho assumia a direção da Diocese, em substituição ao bondoso D. João da Mata Amaral, falecido meses antes.
E março deu outra nota triste para o Brasil, com o falecimento, no Rio do ex-Presidente Artur Bernardes, a quem o País ficou devendo a primeira realização firme e patriótica contra o capitalismo imperialista que ameaçava a integridade física do Brasil, com um contrato oneroso e lesivo aos interesses nacionais, visando a Hileia Amazônica.
Publicado originalmente no jornal O Fluminense em 8 de dezembro de 1973
Na imagem de capa, o ginásio do Complexo do Caio Martins em obras.
Série Niterói em três tempos