Capítulo 45 da Série "A Niterói que eu vi e a que viram meus avós", de Romeu de Seixas Mattos
Do serviço de esgotos sanitários estavam em funcionamento sete quilômetros do distrito norte, inaugurados em 30 de dezembro de 1914, e quinze quilômetros do distrito central, postos em funcionamento em julho de 1915 sem foguetório; havia mais 35 quilômetros de rede construída nos dois Distritos, Central e Sul, precisando de obras complementares para entrar em funcionamento, faltando apenas 32 km de rede para totalizar os 89 km de rede que constavam do projeto revisto pelo Dr.
Ribeiro de Almeida.
Na Repartição de Águas e Esgotos (criada pelo Dr. Carneiro em 1915) estavam como funcionários efetivos os Drs. Ribeiro de Almeida, diretor; Eduardo Pompeia de Vasconcelos, engenheiro-adjunto da seção de esgotos; e Maurício Rodrigues Pereira, na seção de Águas. O Dr. Maurício fora promovido de Inspetor de Obras, com a saída do engenheiro
José Pinto Meira da seção de águas.
Sendo o Dr. Ribeiro de Almeida um fiel observador da técnica sanitária, a rede de esgotos de Niterói havia sido construída com especificações tais que empregou manilhas que podiam suportar, sem porejar, uma pressão d'água interna de mais de trinta metros de altura, juntas estanques experimentadas com fumaça mediante pressão na vala ainda aberta e exame de luz de poço a poço após o aterro da vala, de forma como se visse uma superfície iluminada através de um cano de espingarda, não sendo permitido um coeficiente de infiltração superior a 1:20.000.
Enquanto os esgotos sanitários estiveram sob a direção do Dr. Ribeiro, todos os poços de visita eram caiados de branco por dentro, de modo que, no caso de um enguiço de uma elevatória e a rede viesse a trabalhar em carga, ou outra qualquer ocorrência, ficassem gravados os vestígios do dano, que eram rigorosamente registrados, estudada a sua forma e amplitude, para orientação técnica e fins de estatística.
Havia, naquela época, um serviço de conserva da rede, rigoroso e permanente, que mantinha em perfeito funcionamento os tanques flexíveis; não se esperava que houvesse obstruções na rede de esgoto, e por isso fazia-se sistematicamente a limpeza das galerias com raras extensíveis, com vassouras roliças nas pontas, que removiam todos os resíduos sólidos que não tivessem sido arrastados pelas descargas dos fluxíveis.
O primeiro administrador da conserva da rede de esgotos sanitários foi o falecido
Antônio Ornelas do Couto, que galgou postos mais elevados na PMN e foi eleito Vereador à Câmara Municipal de Niterói, mais tarde.
Como prova de sua dedicação ao trabalho, vou contar aqui um fato que, maledicentemente deformado, passou a história alegre da cidade como uma anedota. Diziam que o Ornelas, no Café Santa Cruz, brigara com quem dissesse que os esgotos de Niterói fediam.
Na realidade, o fato passou-se da seguinte forma:
No Café Santa Cruz reuniam-se os partidários da política de Nilo Peçanha, da qual Ornelas fazia parte, enquanto no Café Londres reuniam-se os adeptos da política contrária.
Havia entre eles o costume de passar trotes pelo telefone, operações que chamaram de "executar o indivíduo".
Alguém, percebendo que o Ornelas agitava-se com qualquer comentário sobre o seu trabalho, falou-lhe, com o fim de passar-lhe um trote, que em determinado ponto da cidade era insuportável o mau cheiro.
Imediatamente o Ornelas seguiu para o local indicado, levando a turma para as devidas providências: nada encontrando no referido local, acabou brigando, não pelo fato de dizerem que o esgoto fedia, mas sim pelo mau gosto da brincadeira, que lhe acarretou perda de tempo.
Imaginem agora, com a situação em que se acham os esgotos de Niterói, como o Ornelas poderia enfrentar a "execução dos Carangas do Norival". Morreria de raiva.
Naquela época o Ornelas foi também atormentado por um caso de sabotagem, feita por um funcionário da PMN que era seu inimigo pessoal, embora seguisse a mesma orientação política, o qual aspirava ao seu lugar
Foi encontrado na rede um plug metálico circular com diâmetro um pouco menor que a galeria de esgotos, terminando o disco com duas pontas em prolongamento do diâmetro que fixavam na rede, dispositivo imaginado pelo sabotador, que conhecia o 'metier'.
Firmando na rede pelas pontas, esse disco se tornava oscilante, de modo a dar passagem às varas da desobstrução e fechar a rede com as descargas dos fluxíveis, um dispositivo bem imaginado, a serviço da perversidade.
Publicado originalmente em O Fluminense, em 15 de setembro de 1975
Pesquisa e Edição: Alexandre Porto
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