Capítulo 48 da Série "A Niterói que eu vi e a que viram meus avós", de Romeu de Seixas Mattos
Ficando sem emprego, em situação difícil, requereu o Dr. Maurício Pereira à Prefeitura Municipal de Niterói para ser incluído como construtor e como instalador de esgotos particulares (atribuição que era concedida aos construtores matriculados na Prefeitura).
Informando o requerimento do Dr. Mauricio, o Dr. Ribeiro de Almeida, na qualidade de membro da Comissão Examinadora de Construtores e Instaladores de esgotos particulares - disse que sendo o candidato Engenheiro Civil estava isento de prestar exame, mas que a lei municipal exigia também que o candidato, para ser inscrito como Construtor e Instalador de Esgotos, devia estar quites com a PMN. Ora, como aquele candidato havia sido seu antecessor como Diretor Geral de Obras, como tal executara serviços prejudiciais à cidade, não poderia considerá-lo quites com a municipalidade de Niterói, motivo por que se dava como suspeito e pedia sua substituição como membro da Comissão Examinadora.
Decidindo a questão, o prefeito Dr. Villanova Machado resolveu indeferir o requerimento do Dr. Mauricio e dar substituto ao Dr. Ribeiro na comissão examinadora de construtores e instaladores de esgotos.
Para mim a solução dada pelo Dr. Villanova Machado foi boa, porque eu era o membro que substituía o examinador que faltasse, e, graças a isso, não tive de descascar esse abacaxi.
Tendo em vista o indeferimento do seu pedido, moveu o Dr. Maurício uma ação judicial contra a Prefeitura de Niterói, por haver recusado a inclusão de um engenheiro civil na relação dos construtores e instaladores de esgotos, se bem que a recusa da PMN se fundamentara não na sua idoneidade técnica, mas na condição de não estar quites com a municipalidade.
Para defender-se nessa ação judicial a PMN requereu uma vistoria ad perpetuam rei memoriam, indicando para seu perito o professor Dr. Domingos Cunha, que também já havia trabalhado, como o Dr. Otávio Carneiro, Dr. Raul Veiga, Dr. Alberto Martins e outros, na Comissão de Levantamento da Planta Semi-cadastral, sob a chefia do Dr. Jorge Lossio.
Para o Dr. Ribeiro, homem inflexível nos princípios e na aplicação da técnica sanitária, o Dr. Maurício era um iconoclasta que se aproximava da loucura.
Por isso, quando na administração do prefeito Homero Pinho, em 1923, o Dr. Ribeiro voltou à PMN, assumindo novamente a direção dos serviços de águas e esgotos de Niterói, em substituição ao Dr. Maurício Pereira, procurou fazer um levantamento geral de tudo aquilo que o Dr. Maurício havia feito e de que ele discordava e que a vistoria ad perpetuam rei memoriam>/i> veio consignar, encontrando declividades reduzidas, profundidades insuficientes e até mesmo contradeclives.
Passaram-se os tempos, a parte dos esgotos feita pelo dr. Maurício, a despeito da falta de técnica que a orientou, funcionou bem ou mal, ainda estando em funcionamento a maioria dos pontos que não puderam ser corrigidos, não recaindo sob a sua responsabilidade a situação atual dos esgotos de Niterói, que a meu ver deve ser proveniente do mau funcionamento dos fusíveis, da falta de retirada das gorduras e ligações de água pluvial na rede, incompatíveis com o sistema separador absoluto, como é o nosso.
Também os 45 quilômetros de rede do distrito Sul, isto é, os 180 litros por segundo, que durante mais de vinte anos escoaram-se através do distrito Central, comprovaram a grande capacidade de esgotamento da rede do distrito Central feita pelo dr. Ribeiro de Almeida.
Em 1943, isto é, vinte anos depois, foi iniciada a construção da estação de tratamento da rua Lemos Cunha, a fim de desligar-se o distrito Sul do distrito Central, objeto para outro trabalho.
Quanto ao Dr. Mauricio Pereira, apesar de reconhecermos a sua audácia e os prejuízos disso decorrentes, para inaugurar um serviço público de tal importância dentro de período muito curto de uma administração, não podemos esquecer que foi ele quem, mal ou bem, criou condições que permitissem à cidade banir os tigres de sua história cotidiana.
O Dr. Ribeiro, mais tarde, analisando com mais serenidade o comportamento do Dr. Mauricio, disse- me: "Parece que o Maurício, com a sua maluquice, talvez tenha conseguido dar ensejo para que se verifique a possibilidade de fazer uma pequena redução nas tabelas de Waring, Stanley e Pearson, prestando com isso um serviço que uma pessoa de juízo perfeito não seria capaz de se arriscar, para fazê-lo, embora a maioria de suas inovações, a meu ver, não possam ser aceitas".
Publicado originalmente em O Fluminense, em 5 de outubro de 1975
Pesquisa e Edição: Alexandre Porto
Na imagem de capa, Homero Brasiliense Soares de Pinho, poeta, advogado e prefeito interino, em 1923. Em fotografia da revista Illustração Fluminense, edição de Novembro de 1923.
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Publicado em 11/11/2024
Ficando sem emprego, em situação difícil, requereu o Dr. Maurício Pereira à Prefeitura Municipal de Niterói para ser incluído como construtor e como instalador de esgotos particulares (atribuição que era concedida aos construtores matriculados na Prefeitura).
Informando o requerimento do Dr. Mauricio, o Dr. Ribeiro de Almeida, na qualidade de membro da Comissão Examinadora de Construtores e Instaladores de esgotos particulares - disse que sendo o candidato Engenheiro Civil estava isento de prestar exame, mas que a lei municipal exigia também que o candidato, para ser inscrito como Construtor e Instalador de Esgotos, devia estar quites com a PMN. Ora, como aquele candidato havia sido seu antecessor como Diretor Geral de Obras, como tal executara serviços prejudiciais à cidade, não poderia considerá-lo quites com a municipalidade de Niterói, motivo por que se dava como suspeito e pedia sua substituição como membro da Comissão Examinadora.
Decidindo a questão, o prefeito Dr. Villanova Machado resolveu indeferir o requerimento do Dr. Mauricio e dar substituto ao Dr. Ribeiro na comissão examinadora de construtores e instaladores de esgotos.
Para mim a solução dada pelo Dr. Villanova Machado foi boa, porque eu era o membro que substituía o examinador que faltasse, e, graças a isso, não tive de descascar esse abacaxi.
Tendo em vista o indeferimento do seu pedido, moveu o Dr. Maurício uma ação judicial contra a Prefeitura de Niterói, por haver recusado a inclusão de um engenheiro civil na relação dos construtores e instaladores de esgotos, se bem que a recusa da PMN se fundamentara não na sua idoneidade técnica, mas na condição de não estar quites com a municipalidade.
Para defender-se nessa ação judicial a PMN requereu uma vistoria ad perpetuam rei memoriam, indicando para seu perito o professor Dr. Domingos Cunha, que também já havia trabalhado, como o Dr. Otávio Carneiro, Dr. Raul Veiga, Dr. Alberto Martins e outros, na Comissão de Levantamento da Planta Semi-cadastral, sob a chefia do Dr. Jorge Lossio.
Para o Dr. Ribeiro, homem inflexível nos princípios e na aplicação da técnica sanitária, o Dr. Maurício era um iconoclasta que se aproximava da loucura.
Por isso, quando na administração do prefeito Homero Pinho, em 1923, o Dr. Ribeiro voltou à PMN, assumindo novamente a direção dos serviços de águas e esgotos de Niterói, em substituição ao Dr. Maurício Pereira, procurou fazer um levantamento geral de tudo aquilo que o Dr. Maurício havia feito e de que ele discordava e que a vistoria ad perpetuam rei memoriam>/i> veio consignar, encontrando declividades reduzidas, profundidades insuficientes e até mesmo contradeclives.
Passaram-se os tempos, a parte dos esgotos feita pelo dr. Maurício, a despeito da falta de técnica que a orientou, funcionou bem ou mal, ainda estando em funcionamento a maioria dos pontos que não puderam ser corrigidos, não recaindo sob a sua responsabilidade a situação atual dos esgotos de Niterói, que a meu ver deve ser proveniente do mau funcionamento dos fusíveis, da falta de retirada das gorduras e ligações de água pluvial na rede, incompatíveis com o sistema separador absoluto, como é o nosso.
Também os 45 quilômetros de rede do distrito Sul, isto é, os 180 litros por segundo, que durante mais de vinte anos escoaram-se através do distrito Central, comprovaram a grande capacidade de esgotamento da rede do distrito Central feita pelo dr. Ribeiro de Almeida.
Em 1943, isto é, vinte anos depois, foi iniciada a construção da estação de tratamento da rua Lemos Cunha, a fim de desligar-se o distrito Sul do distrito Central, objeto para outro trabalho.
Quanto ao Dr. Mauricio Pereira, apesar de reconhecermos a sua audácia e os prejuízos disso decorrentes, para inaugurar um serviço público de tal importância dentro de período muito curto de uma administração, não podemos esquecer que foi ele quem, mal ou bem, criou condições que permitissem à cidade banir os tigres de sua história cotidiana.
O Dr. Ribeiro, mais tarde, analisando com mais serenidade o comportamento do Dr. Mauricio, disse- me: "Parece que o Maurício, com a sua maluquice, talvez tenha conseguido dar ensejo para que se verifique a possibilidade de fazer uma pequena redução nas tabelas de Waring, Stanley e Pearson, prestando com isso um serviço que uma pessoa de juízo perfeito não seria capaz de se arriscar, para fazê-lo, embora a maioria de suas inovações, a meu ver, não possam ser aceitas".
Publicado originalmente em O Fluminense, em 5 de outubro de 1975
Pesquisa e Edição: Alexandre Porto
Na imagem de capa, Homero Brasiliense Soares de Pinho, poeta, advogado e prefeito interino, em 1923. Em fotografia da revista Illustração Fluminense, edição de Novembro de 1923.
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Publicado em 11/11/2024