Historicamente, uma boa obra arquitetônica é resultado boas parcerias. Oscar Niemeyer desenhou o belissimo Museu de Arte Contemporânea, que a Prefeitura de Niterói soube, competentemente, concretizar.
Ganhou o povo de Niterói, ganhou a cultura brasileira e, ganhou o nosso litoral. Um marco.
Esse lindo litoral brasileiro que, ao longo dos 500 anos, conheceu várias formas de ocupação. Uma das mais interessantes, a dos fortes, que os portugueses tão bem construiram, para proteger nossa orla marítima de indesejadas invasões. Arquitetura que tirou do anonimato inúmeros pontões sobre o mar. Embasado de pedras, com grossas paredes caiadas de branco e mais o sereno farol.
Até hoje, os fortes apontam-nos o longinquo horizonte, onde o céu azul desce sobre o azul denso do mar. E vários deles estão tombados pelo Patrimônio Histórico. Tombamentos importantes. Não pelo aspecto nostalgico, mas pela reflexão que nos remete ao presente e ao futuro, a lição de uma boa arquitetura: sua postura, seu desenho e sua relação com a natureza.
Um amigo me apanhou no Aeroporto Santos Dumont, para irmos à inauguração do museu, na semana passada. Atravessamos a ponte Rio-Niterói, sem dúvida, um bonito traço sobre a baia, e, já em Niterói, fomos contornando as praias. Depois de 15 minutos, vislumbramos o museu, altaneiro, no pontão da Praia da Boa Viagem, levemente apoiado sobre as pedras, a 25 metros sobre o mar. Lembrei-me, então, do projeto do Museu de Arte de Caracas, que o próprio Niemeyer projetou há mais de 30 anos: uma pirâmide invertida, portanto, com um só apoio, sobre o morro nos arredores da capital venezuelana, porém não construido. Sem dúvida, muito mais instigante que a pirâmide do Louvre, projetada 20 anos depois. Da geometria tensionada de Caracas, Oscar passa a linhas arredondadas em Niterói.
Forma arredondada que dialoga com a exuberante natureza curva, da baia da Guanabara, da praia de Niterói, do Pão de Açúcar. Tudo muito enriquecedor, que contemplamos desde a rampa de acesso, caminhando em direção à entrada do museu. Um caminhar que mais parece um passeio aéreo. A ida-e-vinda da passarela nos conduz visualmente para o mar, para o Rio, para Niterói. E volta a reflexão: a transição histórica fica mais bonita. Antigamente, um forte, contemporaneamente, um centro cultural a marcar, com dignidade, o nosso litoral.
Os mil metros quadrados do salão de exposições molduram a coleção de João Satamini um excelente e didático panorama das artes plásticas desde a década de 40. O percurso da visita fica enriquecido pela alternância visual que o vidro inclinado propicia, ao enquadrar a paisagem. O espaço solene de um museu tradicional é substituido por um espaço menos artificial, mais do cotidiano. A relação que se estabelece entre o visitante e a obra de arte é mais direta.
Foi muito bonito ver a multidão que acorreu ao museu. A percorrer a rampa e a desfrutar da exposição. A arquitetura do museu, com certeza, atrairá todo o povo de Niterói que ficará conhecendo a obra de nossos pintores. Assim acontece com o Museu Pompidou, que é mais visitado que a Torre Eiffel, até então ponto turistico de maior afluência em Paris.
Bela e marcante, presente e surpreen dente, com fascinio para atrair gente, é outra função, agregadora, da arquite tura na cidade contemporânea.
Do arquiteto Ruy Ohtake para o Jornal do Brasil, 10 de setembro de 1996
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